TEMA
DE REDAÇÃO – UNIFESP 2011
Texto 1
Num restaurante de classe média, pessoas
torcem o nariz e pagam a conta antecipadamente, sem concluir a refeição, porque
na mesa ao lado senta-se um casal negro, com uma filha e um filho adolescentes.
Ninguém comenta ou reclama de que se trata de uma demonstração criminosa de
racismo, não comprovável mas evidente. A adolescente discriminada põe-se a
chorar e pede aos pais para irem embora também. A família comemorava ali o 14º
aniversário dela.
Uma mulher decide sair de um casamento
infeliz e pede a separação. O marido, que certamente também não está feliz,
recusa qualquer combinação amigável e quer uma separação litigiosa. As duas
filhas moças tomam o partido do pai, como se de repente a mãe que delas cuidara
por mais de vinte anos tivesse se transformado em alguém desprezível,
irreconhecível e inaceitável. Nenhuma das duas lhe pergunta os seus motivos;
ninguém deseja saber de suas dores; nenhuma das duas jovens mulheres lhe dá a
menor chance de explicação, o menor apoio. Parece-lhes natural que, diante de
um passo tão grave da parte de quem as criara, educara, vestira, acarinhara e
acompanhara devotadamente por toda a vida, fosse negado qualquer apoio, carinho
e respeito.
Os casos se multiplicam, são muito mais
cruéis do que estes, existem em meu bairro, em seu bairro. Nossa postura diante
do inesperado, do diferente, raramente é de atenção, abertura, escuta. Pouco
nos interessam os motivos, o bem, as angústias e buscas, direitos e razão de
quem infringe as regras da nossa acomodação, frivolidade ou egoísmo. Queremos
todos os privilégios para nós, a liberdade, a esperança. Para os outros, mesmo
se antes eram muito próximos, queremos a imobilidade, a distância. Cassamos sem
respeitar os seus direitos humanos mais básicos. A intolerância, que talvez não
conste no índex das religiões mais castradoras, é com certeza um feio pecado
capital. Do qual talvez nenhum de nós escape, se examinarmos bem.
(Lya
Luft. Veja, 15.12.2004. Adaptado.)
Texto 2
Entrevista com Zilda Márcia Gricoli,
historiadora e diretora-executiva do Laboratório de Estudos da Intolerância da
Universidade de São Paulo (USP), que investiga e discute o tema em todas suas
vertentes.
Qual a proposta do Laboratório de
Estudos da Intolerância?
Trata-se de um centro multidisciplinar
da Universidade de São Paulo (USP) que investiga todos os dilemas da
intolerância, seja ela política, religiosa, cultural, sexual. Incluímos também
o que chamamos de tolerância ao intolerável: prostituição infantil e massacres
de populações indígenas e de rua, por exemplo. Trabalhamos ainda com os
direitos dos animais. Refletindo sobre a forma como os homens os tratam,
descobrimos como eles agem em relação aos seres humanos. Faremos um grande
seminário sobre o assunto, aberto ao público.
Dê exemplos da intolerância no Brasil.
Não toleramos o pobre, por exemplo.
Pobre é lixo, não queremos ver, queremos jogá-los fora. Pode ser índio, negro,
branco. Em São Paulo, há praças que contam com o banco “antimendigo”, com
braçadeiras especiais, que não permitem que ninguém durma ali. Gradearam
chafarizes para que a população não tome banho. Tudo para “limpar” a cidade dos
pobres. Como se eles fossem responsáveis pela sujeira.
É possível desenvolver a tolerância?
Sim. A intolerância é totalmente
cultural. A cultura foi criada pelo homem para a sobrevivência da espécie. Ela
tem esse objetivo, que é a proteção da vida, e não a destruição. A autonomia
cultural não pode ir além da vida humana. Quando a cultura se apropria
da negação do outro, é preciso uma intervenção.
(http://planetasustentavel.abril.com.br.
Adaptado.)
Texto 3
Fascismo, comunismo, nazismo e todos os
outros ismos totalitários produziram ao longo dos tempos algumas das mais pavorosas
cenas de intolerância perpetradas pelo homem contra alguém que ele julga
diferente. “Fogueiras, patíbulos, decapitações, guilhotinas,
fuzilamentos, extermínios, campos de concentração, fornos crematórios,
suplícios dos garrotes, as valas dos cadáveres, as deportações, os gulags, as
residências forçadas, a Inquisição e o índex dos livros proibidos”, descreveu o
jurista italiano Italo Mereu,
são algumas das mais bárbaras manifestações de ódio adotadas por quem julga
“possuir a verdade absoluta e se acha no dever de impô-la a todos, pela força”.
A praga da intolerância só atinge esse patamar de perversidade quando um outro
valor já não vigora
mais há muito tempo: a democracia. É mais ou menos assim que as coisas
funcionam. Aniquila-se a democracia em nome de um ideal revolucionário que
promete semear a liberdade e o fim da opressão dos mais fracos. Essa é a
promessa, mas o que se colhe
jamais é a libertação, apenas abuso e intolerância. Numa primeira fase, o abuso
é interno e concentrado contra os inimigos políticos do regime. Depois, todos
se tornam inimigos em potencial e até a delação de vizinhos vira uma arma de
controle social. Na fase
seguinte, surgem as guerras contra os inimigos externos.
(Amauri
Segalla. Veja, 16.04.2003. Adaptado.)
Com
base nas informações e reflexões dos textos apresentados – ou, ainda, agregando
a eles outros elementos que você julgar pertinentes –, redija uma dissertação
em prosa e em norma padrão sobre o seguinte tema:
A
intolerância em xeque
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