Antonio
Olinto
Soneto
de Natal
“Mudaria
o Natal ou mudei eu?”
Mudaria
o Natal ou mudo iria
mudar sempre o menino o mundo em tudo?
Ou fui só quem mudei, e meu escudo
novidadeiro, múltiplo, daria
mudar sempre o menino o mundo em tudo?
Ou fui só quem mudei, e meu escudo
novidadeiro, múltiplo, daria
ao
mudadiço mito da alegria
em noite tão mutável jeito mudo?
O homem é mudador, muda de estudo,
de mucama, de verso, pouso, dia,
em noite tão mutável jeito mudo?
O homem é mudador, muda de estudo,
de mucama, de verso, pouso, dia,
porque
a muda modula esse desnudo
renascimento em palha, e molda e afia
o instrumento da troca, o fim miúdo,
renascimento em palha, e molda e afia
o instrumento da troca, o fim miúdo,
a
noite amena erguendo-se em poesia.
Mudei eu sempre sem saber que mudo
ou somente o Natal me mudaria?
Mudei eu sempre sem saber que mudo
ou somente o Natal me mudaria?
(Antonio
Olinto)
Teoria
do Homem
o
começo é o fim
o
começo é o homem
o
homem é o fim
meço
o homem pelo fim
o
fim é a medida a medida é o começo
a
medida é o meio o meio é o medo
o
vulto é o vento
o
vento bate na bandeira
parece
passo na pressa
o
passo é a pressa
a
pressa é o modo
o
modo é o mito
o
mito é a meta
o
fim é o mito
o
mito é o começo
o
começo do homem é o fim do homem
o
fim do homem é o começo do homem.
(Antonio
Olinto)
Abertura
Noite
é chuva, plano é longo.
Hora
de abraçar a máquina
medianeira do olho e do objeto
disposta para o módulo dos ritos
através.
medianeira do olho e do objeto
disposta para o módulo dos ritos
através.
Ó
câmara de sutis delicadezas,
brandura carda, mansa entrega,
me ensina a reta prontidão
no pegar cada coisa e seu contorno,
me concede a cordura decisiva
da lente caminhando para a imagem
diretamente.
brandura carda, mansa entrega,
me ensina a reta prontidão
no pegar cada coisa e seu contorno,
me concede a cordura decisiva
da lente caminhando para a imagem
diretamente.
Ferramenta
e musa,
vem comigo às estacas do homem
chamado Sousa,
entra na macia resistência da pele
águas adentro
(sabes: somos em aquário,
nele andamos, consistimos,
amamos
refreados de presenças
além do líquido limite:
em aquário somos).
Mulher e fábula,
tira a transparência
das roupas silenciadas,
restaura os rituais
dos mitos cotidianos
passados de fêmea a fêmea,
mãe, irmã, amante,
câmera votiva.
vem comigo às estacas do homem
chamado Sousa,
entra na macia resistência da pele
águas adentro
(sabes: somos em aquário,
nele andamos, consistimos,
amamos
refreados de presenças
além do líquido limite:
em aquário somos).
Mulher e fábula,
tira a transparência
das roupas silenciadas,
restaura os rituais
dos mitos cotidianos
passados de fêmea a fêmea,
mãe, irmã, amante,
câmera votiva.
Que
importa sejas metal agora,
vidro, foco, olho de máquina,
para a justa visão da coisa vista?
vidro, foco, olho de máquina,
para a justa visão da coisa vista?
Eia,
câmera, comigo
ao plano largo, noite chuva.
ao plano largo, noite chuva.
(Antonio
Olinto)
Infância
"Meninos soltando pipa". Portinari. |
de que vale?
O menino soltava papagaio
no morro transformado em nova imagem
tão nítida que vai além retângulo,
termina no prelúdio de uma nuvem
e o grito batia longe
na tarde dos bambuais
de que vale?
Sousa já era mas sorria,
tinha o fascínio dos começos,
a fixidez dos olhos sendo
nada e flor.
A voz que subia aflita
(só podia ser da mãe)
talava da noite próxima
e de bichos escondidos
pelo pasto,
no regato,
no caminho,
pela sombra deslizada de repente
de que vale?
Na descida tudo vinha
em gesto nem sempre visto
de papagaio vermelho,
papel de seda rasgado
na maciez do paiol.
Súbito
era noite e um cão latia
alto.
(Antonio
Olinto)
Fala
do Sousa
O
desígnio das coisas
ferido de espera.
Nem poderia ser, como pensais,
de lastro diferente.
Sabeis e guardais remanso.
Vinde à frente do palco
no risco da luz firmada
que os olhos querem vossa fala.
caso inventado mas pende
da mais sólida nuvem.
As tábuas estão aí,
a mesa, o pão, a roupa
e as gentes.
Nas cadeiras que vos olham
a certeza de vossa força.
Traçai o desenho
do que está vindo,
erguei a mão em rito,
fazei objetos.
Agora vejo.
Esse traço é o caminho da moça?
Completai-o que desce um cântico,
não deve ser interrompido.
O desígnio da moça
repousa em nervos de flor.
Riscai outros.
Esse não conheço.
Da que foi mãe?
Parece mais linha sem ponta.
Aonde irá?
ferido de espera.
Nem poderia ser, como pensais,
de lastro diferente.
Sabeis e guardais remanso.
Vinde à frente do palco
no risco da luz firmada
que os olhos querem vossa fala.
caso inventado mas pende
da mais sólida nuvem.
As tábuas estão aí,
a mesa, o pão, a roupa
e as gentes.
Nas cadeiras que vos olham
a certeza de vossa força.
Traçai o desenho
do que está vindo,
erguei a mão em rito,
fazei objetos.
Agora vejo.
Esse traço é o caminho da moça?
Completai-o que desce um cântico,
não deve ser interrompido.
O desígnio da moça
repousa em nervos de flor.
Riscai outros.
Esse não conheço.
Da que foi mãe?
Parece mais linha sem ponta.
Aonde irá?
(Antonio
Olinto)
IV
Faço-me
palavra
Ave
Palavra,
faço
de meu corpo uma árvore em que pouses
faço-me
palavra eu também
divido-me
nas sílabas necessárias
com
tímbales e cânticos
vestir-me-ei
por inteiro de palavras
que
só existo quando através de ti.
Ave
Palavra.
V
A
paisagem
Nesse
ínterim
esvaziam-se
as palavras
inúteis
vindas
na enxurrada
em
queda no vazio
de
listas e sinais.
Sem
elas
desaparece
o pleno sentido
some
ajusta aceitação
de
morros e flores
de
rios e mares
e
ao longo da planície
as
palavras renascem
para
que delas saia de novo
a
paisagem.
Trago-te
os rios
umedecidos
de infância.
Não
digas que há esquivanças
neste
gesto doado.
Venho
com passos naturais,
com
piedade, sacrifício,
entregar-te
a colheita dos olhos,
o
fardo dos claros fracassos.
A
pluma capturada
nas
realidades sem mistura,
o
tenteio do vento
no
corpo oferecido as notícias,
a
flor presa na mão branca,
o
espanto da esposa iniciada,
o
passeio exato no jardim —
estão
comigo, estas coisas,
nesta
verdade do canto,
na
quietude dos átrios acalmados.
Trago-te
os beijos da criança,
a
paisagem ao redor da fazenda,
os
brinquedos de barro já com sangue,
os
lençóis do justo nascimento.
a
mão pousada na madeira,
o
sorriso apenas formulado,
a
aceitação do gosto recebido,
a
alegria das brasas extintas.
Venho
dar-te notícias das coisas
esparzidas
nos campos lá fora,
entregar-te
o resíduo das datas,
o
sinal de uma face marcada
para
o largo consumo do amor.
(Antonio
Olinto)
O
crime da máquina
A máquina rodou só
nos trilhos limpos,
foi matar a menina de vermelho.
Bastou um grito para o espanto
fixar-se na tarde.
Desceu gente de longe,
homens pisaram pedras,
mulheres jogaram noites na pressa,
os pais surgiram de súbito.
Um sangue ungia rodas e trilhos,
pedaço de vestido repousava em dormente.
Lanternas acesas na lida em vôo,
foram examinar a máquina,
o freio intacto,
as peças nuas,
a chaminé parada em pânico.
Rodara só
nos trilhos limpos.
Em desvio de falas,
colheram saudades da menina,
assistiram ao desfile das pausas,
contaram casos de nascimento.
A manhã parou na máquina,
os homens trouxeram cadeiras,
fizeram um círculo de vozes,
ergueram pedaços do crime.
Depois, tomaram café,
deram seus votos
e fitaram, em rápida apreensão,
a máquina condenada.
Levaram-na para um desvio,
destruíram os trilhos de um lado e de outro,
fundaram cerca de arame ao redor,
deixaram placa de madeira
com letras em quase cruz.
Quando as outras máquinas passam
nos trilhos mais longe
apitam avisos,
rodam mandadas,
contemplam a cela tênue,
plantas agora buscando as fendas
da quieta locomotiva.
A máquina rodou só
nos trilhos limpos,
foi matar a menina de vermelho.
Bastou um grito para o espanto
fixar-se na tarde.
Desceu gente de longe,
homens pisaram pedras,
mulheres jogaram noites na pressa,
os pais surgiram de súbito.
Um sangue ungia rodas e trilhos,
pedaço de vestido repousava em dormente.
Lanternas acesas na lida em vôo,
foram examinar a máquina,
o freio intacto,
as peças nuas,
a chaminé parada em pânico.
Rodara só
nos trilhos limpos.
Em desvio de falas,
colheram saudades da menina,
assistiram ao desfile das pausas,
contaram casos de nascimento.
A manhã parou na máquina,
os homens trouxeram cadeiras,
fizeram um círculo de vozes,
ergueram pedaços do crime.
Depois, tomaram café,
deram seus votos
e fitaram, em rápida apreensão,
a máquina condenada.
Levaram-na para um desvio,
destruíram os trilhos de um lado e de outro,
fundaram cerca de arame ao redor,
deixaram placa de madeira
com letras em quase cruz.
Quando as outras máquinas passam
nos trilhos mais longe
apitam avisos,
rodam mandadas,
contemplam a cela tênue,
plantas agora buscando as fendas
da quieta locomotiva.
(Antonio
Olinto)
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