Alvoroço
de festa no céu
Não é que na véspera do Carnaval houve no céu uma
festa para os bichos da selva?
Os convites foram entregues por um beija-flor que
delicadamente os deixava em cima de corolas de vitorias-regias. O bicho que ia
passando via o seu nome no envelope e pulava de alegria: tinha sido contemplado
com um programa para o fim de semana!
Mas notaram todos que só recebiam convites os
bichos de asa. O que era uma injustiça. Pelo menos foi o que o sapo gordo
pensou. Os animais de terra estavam conformados, esperando o dia em que
houvesse a festa lá na selva mesmo. Mas, como eu disse, o sapo verde não. Todos
riam dele e de suas reclamações coaxadas e inúteis.
Ele aproveitou o fim manso de tarde para gritar bem
alto e ser bem ouvido.
— Eu também vou!
Cadê tuas asas, bicho feio?
Foi então que pensou: devo consultar quem é igual a
mim, porém mais velho. E realmente, no brejo que ficava entre samambaias e
avencas, encontrou um sapo velho e cheio de sabedoria chamado Quá-quáqua.
Este se amedrontou com as intenções do sapo jovem:
— Olhe, é melhor para a sua saúde não sair do chão
e ter água por perto.
Então o sapo jovem disse-lhe:
— O senhor é capaz de guardar um segredo? Pois bem,
eu vou dançar lá em cima. Basta-me que o urubu feio leve o seu violão.
Qua-qua-qua disse-lhe que não o entendia.
O sapo foi falar com o urubu:
— Você vai levar seu violão, urubu?
O urubu, de violão debaixo da asa, nem se dignou a
responder.
— Senhor urubu, quer me fazer um único favor? O de
ver se estou naquela esquina?
O urubu, meio burro, replicou que, já que era um só
favor, ele iria. E não carregou o violão. O sapo mais que depressa entrou no
violão e ficou lá bem quieto, embora tivesse uma vontade louca de fumar. O
urubu voltou para lhe dizer que não o havia encontrado na esquina — mas cadê o
sapo? Sumira, pensou. E pensou: agora vou para o céu.
Para encurtar a história, o sapo, dentro do violão,
chegou ao céu e mais do que depressa pulou para fora e começou a dançar todo
feliz. Os pássaros se espantaram, perguntaram ao senhor sapo como havia
chegado. Mas a alma do negócio é o segredo e o sapo só respondeu malcriado:
— É que eu me arranjo sempre!
E entrou de novo sorrateiro no violão para ir
embora. Mas o urubu percebeu a coisa e ficou raivoso:
Espertinho, não é? Pois agora mesmo é que você vai
voar, vou te soltar no ar. Então o sapo pediu todo manhoso:
— Está vendo aquela pedra e aquele lago? Pelo amor
de Deus, deixe eu cair na pedra porque se eu cair no lago eu me afogo!
— Pois é no lago que eu vou te largar, para você
morrer!
O sapo, bem feliz, caiu no lago, e salvou-se.
Moral da festa? Bem, não houve.
(Clarice
Lispector, in “Como nasceram as estrelas”)
Leia também:
"O siri higiênico" — Moacyr Scliar
"A Iara" — Monteiro Lobato
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