Os textos I e II servem de referência para responder às questões
de 01 a 04.
Texto I
Texto II
Vencedor de Cannes, “Entre os muros da escola”, retrata cotidiano de
estudantes franceses
Em uma escola francesa,
na periferia de Paris, reúnem-se jovens de origens, etnias, religiões e hábitos
muito diferentes.
Como Wei, imigrante
chinês estudioso e fã de games; Souleymane, filho de imigrantes malineses
desinteressado nas aulas, mas com um talento secreto para a fotografia; e
Esmeralda, a garota rebelde que só usa gírias durante a classe, mas lê Platão
nas horas vagas. Com o giz na mão e a árdua tarefa de atrair a atenção e
ensinar francês aos garotos está o professor François Marin, dedicado e
apaixonado pelo ofício, mas visivelmente frustrado com a dificuldade de lidar
com a falta de interesse da turma. É em torno da relação conflituosa criada na
sala de aula que gira o filme de Laurent Cantet.
Os alunos de Marin são
uma espécie de síntese da França atual. Filhos de imigrantes asiáticos, árabes
e africanos, não se reconhecem nem como franceses nem como estrangeiros e
transitam numa espécie de limbo de identidade. Do outro lado, os professores
também não sabem como reagir à apatia e à falta de disciplina dos alunos. E
enquanto o assunto é discutido exaustivamente em reuniões a portas fechadas, a
escalada da violência na sala de aula aumenta.
Vencedor da Palma de
Ouro em Cannes no ano passado, o filme é baseado no livro homônimo de François
Bégaudeau – que também vive o protagonista do filme e assina o roteiro – sobre
sua experiência como professor em Paris.
Apesar de ser uma
ficção, a fita tem um tom documental. Com fotografia discreta e sem trilha
sonora, toda a ação se passa dentro da escola.
Os personagens são
interpretados por alunos e professores da escola onde foi feita a filmagem.
Para ter mais
agilidade, Cantet optou pelo uso de câmeras digitais, que registraram
minuciosamente gestos e expressões dos garotos.
Partindo de um roteiro
inicial genérico, as cenas e os diálogos foram ganhando forma ao longo desse
processo, com a participação dos adolescentes e dos professores.
FOLHA DE S. PAULO, São Paulo, 9 mar. 2009, p. 3. Folhateen. Cinema. (Adaptado).
QUESTÃO 01 - Os elementos imagéticos do texto I, tais como a apresentação do título,
as diferenças físicas entre as personagens e as posições que elas ocupam no
cartaz, aliados às informações do texto II, sugerem que a escola retratada no
filme
(A) defende a quebra de regras em nome da liberdade que todo jovem
merece ter.
(B) constitui um lugar inacessível para aqueles que migram para outros
países.
(C) representa um espaço em que os conflitos emergem, refletindo a
realidade da sociedade contemporânea.
(D) desconsidera os conflitos reais e cria a ilusão de ser um mundo
ideal.
(E) reforça o seu papel de protetora dos desprivilegiados cultural e
socialmente.
QUESTÃO 02 - Segundo a resenha (texto II), a principal ideia defendida pelo filme Entre
os muros da escola parte do argumento de que
(A) a comunidade francesa aceita as diferenças culturais advindas da
constante imigração afroasiática.
(B) o professor promove a igualdade social em sala de aula ao romper com
o abuso de poder.
(C) o debate ideológico entre professor e alunos favorece o
amadurecimento social dos adolescentes.
(D) a diversidade multiétnica intensifica a integração sociopolítica dos
indivíduos de um país.
(E) a existência de conflitos interculturais abala os alicerces da identidade
francesa.
QUESTÃO 03 - Por se tratar de uma resenha jornalística, o autor do texto II avalia o
filme recorrendo ao uso de
(A) ironia a respeito da crise política vivenciada pelo sistema educacional
francês.
(B) dados que evidenciam o abismo sociocultural existente na sociedade
francesa atual.
(C) informações acerca do conflito de gêneros e do papel do professor.
(D) notícias sobre a estreia do filme no festival de Cannes no ano de
2009.
(E) espaços diferentes que marcam a ambientação das cenas do filme.
QUESTÃO 04 - Ao descrever os fatos recriados no filme, o resenhista sugere que, na
trama, predomina a
(A) comicidade (B) incredulidade (C) denúncia (D) diversão (E) ambiguidade
Leia o texto abaixo para responder às questões de 05 a 08.
A senhora imagine, por
favor. Eu tinha dezenove anos. Podia ter mais ou menos, podia ter quinze ou
quarenta, essa questão do tempo já não se resolve mais do modo normal para mim,
nem me preocupo em saber quantos anos tenho hoje, pode arriscar um palpite, se
quiser, pouco me importa, sei que tinha dezenove anos porque a data ficou
marcada em vermelho naquele calendário ali, na parede, veja. Aliás, devia
rasgar isso, vou rasgar, pronto, rasguei, pode conferir, rasguei o calendário, apaguei
o tempo assim, num passe de mágica, agora não saberemos nada do
passado remoto, anterior à data marcada naquele ex-calendário, em breve não nos
lembraremos mais sequer de que dia é hoje, em que ano estamos, vou fazê-la esquecer
de tudo, em breve seremos quase eternos.
Era uma noite fria, eu
estava no metrô, voltando do cinema, não devia ser muito tarde, dez e meia,
onze horas, estava com sono, como sempre me acontecia ao sair do cinema, agora não
vou mais ao cinema, há milênios não vejo um filme. [...]
Havia pouca gente no
metrô, eu estava sentado sozinho numa fileira de bancos duplos, encostado à
janela, não queria pensar em nada, ver nada, só queria ficar quieto, feito um cão
sob a marquise num dia de chuva, enroscado em si mesmo, se aquecendo, eu
não pensava em nada, via o escuro do túnel pela janela do metrô e os anúncios
nas estações quando o trem parava, anúncios gigantes, luminosos. Um deles era
de uma churrascaria e fiquei puto, desculpe o linguajar, sei que não
gosta desses termos chulos, mas fiquei muito puto quando vi aquele anúncio, um
espeto enorme, com a carne sangrando. Senti uma dor na boca do estômago,
estava com fome, naquele dia só tinha almoçado, e mal, não tinha um centavo no
bolso, só conseguiria algum dinheiro no dia seguinte e o dia seguinte ainda
demoraria horas para chegar, aquela foto me acertou um direto na barriga, o
cara que botou aquilo ali acabara de me dar um soco, o filho da puta,
perdão.
[…] Eu às vezes
abordava uns turistas e os mais ingênuos acabavam me aceitando como guia, o que
me rendia alguns trocados, vez ou outra ajudava num bar perto de onde eu
morava, servia os fregueses, ajudava no balcão quando um funcionário faltava, também trabalhei distribuindo na rua aqueles panfletos de
propaganda, na Saara, fazia coisas desse tipo, bicos, nada muito sério,
na verdade minha principal fonte de renda, digamos assim, vinha dos livros que eu vendia para os sebos e,
vez ou outra, para algum colecionador.
Os livros eu roubava
das bibliotecas. Era um ladrão de livros, ladrãozinho de terceira categoria mas
ladrão, roubava de bibliotecas públicas, ou de universidades, vez ou outra
arriscava uma livraria também, era um trabalho agradável, se me permitir que chame de trabalho aquele exercício de mudar o endereço dos
livros. Meu ganho era mínimo, uma ninharia, mas meus gastos também
eram mínimos, de modo que aquilo era o suficiente pelo menos para me manter
vivo, e naquela época eu não queria muito mais do que isso, estar vivo.
CARNEIRO, Flávio. A confissão. Rio de Janeiro: Rocco, 2006. p.
11-14.(Adaptado).
QUESTÃO 05 - Com base no trecho do romance A Confissão, pode-se reconhecer como
características discursivas do texto
(A) a descrição do tempo e do espaço, a narração fragmentada de fatos
comuns no cotidiano das pessoas e a apresentação de apenas um eixo de conflito,
tal como requer o gênero.
(B) a representação cronológica de fatos e experiências, a
desvalorização das sensações das personagens e a agilidade narrativa ao
apresentar as ações do narrador.
(C) a preocupação com o uso da variedade regional, a definição de traços
socioculturais identificadores das personagens e a narração das lembranças em
segundo plano.
(D) a narração de acontecimentos particulares, a descrição de sensações
e experiências e as escolhas lexicais que marcam a preocupação do narrador em
relação ao seu interlocutor.
(E) a utilização do fluxo de consciência, o uso do monólogo interior
para expressar os vários estados de espírito vivenciados por outras personagens
e o apagamento das marcas de interlocução.
QUESTÃO 06 - O título “A confissão”, associado ao trecho transcrito do romance de
Flávio Carneiro, permite a afirmação de que
(A) o narrador-personagem busca em sua memória fatos condenáveis de sua
infância para compor um relato escrito.
(B) a trama se constitui na medida em que o narrador-personagem revela
seus segredos a um interlocutor específico.
(C) a imaginação perturbada do narrador o leva à ilusão de ser
protagonista das experiências relatadas em seu diálogo com a interlocutora.
(D) a revelação dos segredos pelo narrador-personagem desencadeia o
início do amor impossível de que trata o romance.
(E) o tempo da narrativa dilui a gravidade dos segredos juvenis do
personagem-narrador, tornando-os irrelevantes na fase adulta.
QUESTÃO 07 - No texto, acontece uma transformação no estado de espírito do
narrador-personagem. Considerando a ordem das expressões abaixo, quais
figurativizam essa transformação?
(A) “Cão sob a marquise” e “fiquei puto”.
(B) “Filho da puta” e “boca do estômago”.
(C) “Ladrãozinho de terceira categoria” e “bicos”.
(D) “Apaguei o tempo” e “passe de mágica”.
(E) “Endereço dos livros” e “uma ninharia”.
QUESTÃO 08 - No trecho, “desculpe o linguajar, sei que não gosta desses termos chulos”,
o modo imperativo do verbo indica
(A) súplica para conquistar a adesão do interlocutor às ideias do
narrador-personagem.
(B) ordem expressa para conduzir as ações praticadas pelo interlocutor.
(C) pedido formal para marcar o lugar de autoridade do locutor.
(D) estratégia de atenuação para garantir a manutenção da interlocução.
(E) mecanismo de simulação para distorcer as reais intenções do
narrador-personagem.
Leia o texto abaixo para responder as questões 09 e 10.
QUESTÃO 09 - Com base nos quadrinhos, que fenômeno de linguagem pode ser relacionado
à compreensão de que os registros dos ciclos biogeoquímicos são imperfeitos?
(A) O uso de gírias atuais, como “bróder” e “demorô”, na fala do
esqueleto.
(B) A utilização do tempo pretérito para se referir aos fósseis.
(C) O predomínio da linguagem formal na fala do cientista.
(D) A oposição conceitual entre os termos “pia” e “privada”.
(E) A negação enfática e intrometida do esqueleto no segundo quadrinho.
QUESTÃO 10 - No texto, a expressão “elo perdido” apresenta dois sentidos diferentes.
Quais são esses dois sentidos?
(A) Cadeia inorgânica e indivíduo indesejável.
(B) Ser definidor da espécie e pessoa irritada.
(C) Fóssil imprestável para pesquisa e sujeito atrevido.
(D) Forma de desaparecimento voluntário e pessoa aflita.
(E) Espécie hipotética intermediária e sujeito perturbado.
LITERATURA BRASILEIRA
QUESTÃO 11 - Leia o fragmento a seguir.
O tambor e a dança são
invenções do Jacaré, que os homens receberam de legado para compensar suas
misérias. Dançando e percutindo o tambor os homens mantêm o Jacaré adormecido, impedindo
que a terra trema e as águas primordiais sejam
cuspidas pela boca da Serpente-dragão, num outro dilúvio. Os monstros
subterrâneos deixam escapar pequenos suspiros d'água, em forma de nascentes,
que descem as chapadas, umedecendo as florestas. O Jacaré acordará um dia,
destruindo o mundo dos homens.
Contra o perigo se
resguardavam os cariris, primeiros habitantes desta terra, zelo de que também
se tomaram os brancos colonizadores, quando chegaram matando o que era vivo.
Traziam os negros da África, com os mesmos olhos dos índios, de enxergar o
sagrado em tudo.
BRITO, Ronaldo Correia de. Livro dos homens. São Paulo: Cosac
Naify, 2005. p. 58.
No conto “A peleja de Sebastião Candeia”, de que se extraiu o fragmento
acima, presentifica-se uma das temáticas recorrentes na obra Livro dos
homens, a qual se expressa pela
(A) reelaboração de mitos da cultura africana.
(B) banalização da cultura indígena.
(C) valorização de tradições culturais.
(D) negação de crenças religiosas.
(E) rendição do sertanejo às misérias humanas.
QUESTÃO 12 - Leia o fragmento abaixo.
XIV
Sete de setembro
I
[...]
O santo amor dos corações ardentes
Achou eco no peito dos valentes
No campo e na cidade;
E nos salões — do pescador nos lares,
Livres soaram hinos populares
À voz da liberdade!
[...]
II
Anos correram; — no torrão fecundo
Ao sol de fogo deste novo-mundo
A semente brotou;
E franca e leda, a geração nascente
À copa altiva da árvore frondente
Segura se abrigou!
À roda da bandeira sacrossanta
Um povo esperançoso se levanta
Infante e a sorrir!
A nação do letargo se desperta,
E — livre — marcha pela estrada aberta
Às glórias do porvir!
[...]
ABREU, Casimiro de. As primaveras. São Paulo: Martin Claret,
2008. p. 58-59.
No Livro Primeiro de As primaveras, há poemas marcados por um
ideário patriótico, deflagrado pela independência política do país. Os
escritores românticos desse período tomaram para si a tarefa de erguer as bases
da identidade nacional tematizando a pátria e o povo brasileiro, como revela o poema
“Sete de setembro”, de Casimiro de Abreu. Em relação a esse ideário patriótico,
a ideia que está presente nas três estrofes transcritas, conferindo-lhes
unidade, é a de
(A) idealização do povo brasileiro.
(B) exaltação da luta pela liberdade.
(C) expectativa da grandeza futura do país.
(D) celebração do amor à bandeira pátria.
(E) valorização da natureza brasileira.
QUESTÃO 13 - Leia o fragmento que segue.
Quando morava em
Londres vi um filme interessante, do Wim Wenders e do Antonioni, se não me
engano. A certa altura do filme, um personagem conta a história de uma
expedição de arqueólogos ingleses ao México, à procura de registros da
civilização asteca. Os ingleses contratam uma equipe de guias formada por
nativos e iniciam a expedição. A certa altura, sem motivo algum, os nativos
interrompem a caminhada. Os arqueólogos se espantam, ficam irritados, o tempo é
precioso e eles estão pagando pelo trabalho dos guias. […] Os ingleses insistem,
querem uma explicação, exigem, e só então o chefe dos nativos explica: haviam
caminhado muito depressa e as almas tinham ficado para trás. Por isso
permaneceram sentados, esperando, até que as almas se juntassem novamente aos
corpos e eles pudessem seguir viagem.
CARNEIRO, Flávio. A confissão. Rio de Janeiro: Rocco, 2006. p.
144-145.
A Geografia concebe as expedições como os primeiros instrumentos de
construção do conhecimento geográfico, assim como ocorreu no Brasil com os
primeiros viajantes que registraram suas impressões sobre os lugares
explorados. No trecho citado, o narrador alude à expedição, que, na parte sublinhada,
se configura como metáfora para a compreensão do enredo. No que diz respeito ao
percurso do protagonista, tal metáfora refere-se
(A) à reflexão sobre a necessidade de viajar, que o leva a valorizar as
experiências das andanças.
(B) ao cansaço após todas as peregrinações, que o conduz a buscar outro
modo de viver.
(C) ao desgaste pelas aventuras vividas na Europa, que o faz mudar o
destino das viagens.
(D) à consciência do conhecimento adquirido de modo aleatório, que o
conduz à vontade de parar.
(E) ao acúmulo de informações sobre os países, que o faz perceber o
quanto ainda faltava conhecer.
QUESTÃO 14 - Os livros O demônio familiar, de José de Alencar, e Memórias de
um sargento de milícias, de Manuel Antônio de Almeida, representam costumes
de um dado contexto social. Assim, o primeiro livro enquadra-se na comédia de
costumes e o segundo, no romance de costumes. A filiação dessas obras a tais
gêneros é reconhecida porque nelas se constatam, respectivamente,
(A) elaboração de cenas desvinculadas de sentidos moralizantes; presença
de heróis com características do pícaro da novela espanhola.
(B) manutenção de uma condição social sustentada pela escravidão
doméstica; foco nos contextos aristocráticos relacionados à classe social alta.
(C) construção do desfecho caracterizado por desentendimentos generalizados;
fixação da malandragem por meio de situações cômicas.
(D) reprodução do modo de vida das mulheres definido pelos padrões
patriarcais; enaltecimento de valores representativos das instituições
religiosas.
(E) representação de personagens inspiradas na burguesia vigente;
configuração de traços caricaturais de variados tipos populares.
QUESTÃO 15 - Leia os trechos dos poemas a seguir.
A VALSA SERESTA
Tu, ontem,
Na dança
Que cansa,
Voavas
Co'as faces
Em rosas
Formosas
De vivo,
Lascivo
Carmim;
Na valsa
Tão falsa,
Corrias,
Fugias,
Ardente,
Contente,
Tranquila,
Serena,
Sem pena
De mim!
Quem dera
Que sintas
As dores
De amores
Que louco
Senti!
Quem dera
Que sintas!...
— Não negues,
Não mintas...
— Eu vi!...
[…]
ABREU, Casimiro de. As primaveras. São Paulo: Martin Claret, 2008.
p. 83.
[...]
Parar à tua porta
e nem bater... A um canto
ficar como afinando
um violão invisível
que será contracanto
ao desencanto e ao canto
que em mim, como falhada
voz de um pássaro, dorme
dentro de mim, bem dentro.
[...]
SOUSA, Afonso Felix de. Nova antologia poética. Goiânia:
Cegraf/UFG, 1991. p. 125.
Nestes trechos encontra-se uma característica essencial à identificação
do gênero lírico, que é a
(A) alusão a desencontros amorosos.
(B) valorização de um tempo pretérito.
(C) apresentação de estados de alma.
(D) descrição metafórica da mulher.
(E) tematização de ritmos musicais.
QUESTÃO 16 - Leia os seguintes fragmentos.
Ele ficou ainda um
tempo naquela posição e quando levantou a cabeça e me olhou levei um susto: era
exatamente igual a mim, tinha o meu rosto quando jovem, magro, branco, muito
branco, uns vinte anos, senti um calafrio correndo por toda a espinha, era como
se eu estivesse me olhando no espelho, num antigo espelho. Sou eu, falei comigo
mesmo, aquele garoto sou eu. Ele ficou me olhando, a expressão neutra,
olhávamos fixamente um para o outro mas o rosto dele não se alterava, nada, por
um momento tive a impressão de que ele não me via, de que eu estava invisível,
ele talvez estivesse vendo apenas alguma coisa no muro, um cartaz, uma coisa
qualquer, não olhava para mim, olhava através de mim, foi o que pensei.
CARNEIRO, Flávio. A confissão. Rio de Janeiro: Rocco, 2006. p.
193-194.
Caiu de cócoras, sem
tino de nada, e só então reparou na roupa desalinhada do marido, na barba de
dias e nas migalhas de bolo presas aos fios do bigode. Tomada por uma ternura
insuportável, abraçou-se a ele aos prantos, e o perdoou por deixar seus objetos
pessoais, selas, arreios e esporas em profusão, para ela que há tempo não
montava um cavalo, pois engordara muito. Nos anos de luto que estavam por vir,
teria de justificar às visitas a parede que erguera, dividindo a casa em duas.
Um vão inteiro servia apenas para esconder as lembranças do marido. Naquele
santuário escuro e fedorento a mofo, ninguém entrava, a não ser os netos,
guardiões assombrados da história de Francisco Vieira, Chiquinho, como só ela
chamava.
BRITO, Ronaldo Correia de. Livro dos homens. São Paulo: Cosac
Naify, 2005. p. 136.
Comparecem nestes fragmentos marcas da ficção contemporânea que, no
contexto de cada uma das obras a que eles pertencem, são representadas,
respectivamente, pela
(A) tematização da loucura; adesão ao ponto de vista do marginalizado.
(B) fragmentação do ser; superposição de diversos planos temporais.
(C) descaracterização do gênero confessional; ruptura das fronteiras
espaciais.
(D) ênfase na linearidade do enredo; recorrência de desfechos em aberto.
(E) presença do narrador em primeira pessoa; utilização de recursos
intertextuais.
QUESTÃO 17 - Por se afastar das orientações gerais que caracterizam o Romantismo
brasileiro, o romance Memórias de um sargento de milícias ocupa uma
posição singular entre as obras que pertencem a esse período literário. No
contexto dessa obra, tal singularidade evidencia-se na
(A) estrutura do livro, composta de episódios alternados e capítulos
curtos.
(B) linguagem do narrador, marcada pela coloquialidade e simplicidade
expressiva.
(C) temática histórica, buscada no Brasil do reinado de Dom João VI.
(D) composição das personagens, desprovida de caracteres idealizantes.
(E) matéria do enredo, baseada em ações cotidianas de pessoas comuns.
QUESTÃO 18 - Leia os textos a seguir.
Máscaras
A vida nos põe no rosto
máscaras de gosto e desgosto
que o tempo afoga
em espelho sem nexo
e sem tamanho
onde fica o reflexo
do rosto de um estranho
que se interroga
SOUSA, Afonso Felix de. Nova antologia poética. Goiânia:
Cegraf/UFG, 1991. p. 185.
[…] já não estou certo
do fato de ser um homem ou alguma outra coisa não definida, quem sabe tenha me
transformado num ser híbrido, entre homem e Deus, embora ninguém acredite em mim,
nem mesmo a senhora, o que é realmente uma pena. [...] Então, se ninguém
acredita em mim, sobretudo a senhora, posso me considerar Deus? Não? Mas homem
também não sou, pelo menos não do tipo que se conhece. Então o que é que eu sou?,
a senhora me faria o favor de responder a esta pergunta: o que é que eu sou?
CARNEIRO, Flávio. A confissão. Rio de Janeiro: Rocco, 2006. p.
158.
A reflexão elaborada pelo eu lírico do poema “Máscaras” remete a um
questionamento recorrente em Nova antologia poética, o qual está
presente também no romance de Flávio Carneiro como um dos motivadores da
confissão feita pelo protagonista. O sentido partilhado pela reflexão elaborada
nos textos transcritos acima é instaurado pela
(A) compreensão do significado do tempo, elaborada no processo natural
de crescimento do ser.
(B) perda das marcas de humanidade, ocasionada pelo confronto do ser com
as dificuldades da vida.
(C) transformação de experiência em aprendizado, promovida pela crença
nos desígnios de Deus.
(D) consciência da instabilidade da essência do ser, adquirida no
percurso do destino humano.
(E) indagação acerca da identidade do ser, motivada pela vontade natural
de autoconhecimento.
QUESTÃO 19 - Entre as características do Romantismo brasileiro, a que está corretamente
inserida no contexto da comédia O demônio familiar e se filia ao projeto
romântico de nacionalização da Literatura brasileira é a
(A) reivindicação de uma forma brasileira de expressão da língua
portuguesa, compreendida na crítica à fala afrancesada de Azevedo.
(B) valorização da cultura nacional, explícita nos reiterados elogios e
na calorosa defesa das personagens à arte e aos artistas brasileiros.
(C) representação heroica do homem brasileiro, fixada pelos traços
idealizantes e pelas ações enobrecedoras da personagem Eduardo.
(D) tematização da sociedade brasileira, expressa na investigação minuciosa
do drama da escravidão e na crítica à burguesia fluminense.
(E) exaltação da liberdade formal, evidenciada no modo simples e
eficiente como a personagem Pedro distingue prosa e poesia.
QUESTÃO 20 - Leia os fragmentos do poema abaixo.
Romance de Itapoã
[…]
— Ó conchas, dizei-nos
que par era o par
entrando na igreja
para se casar?
— Foi um senhor nobre
daqui do lugar.
E a moça de encanto
assim singular,
a afogar-se em rendas
de um branco lunar,
não veio das nuvens
e nem de além-mar.
Eu vos digo: era ela
a bela Guiomar.
Não se vira nunca
um mais puro olhar
do que o dela quando
chegava ao altar.
E por muito tempo
não se ouviu contar
que houvesse entre os homens
outro similar
a mostrar no porte
força de um jaguar
e que assim tivesse
majestades no ar,
como era o marido
da bela Guiomar.
[...]
— Dizei-nos, ó conchas,
onde foi parar
depois o marido
da bela Guiomar.
— Ninguém nunca soube,
nem se ouviu contar.
Deixou a Bahia
sem que terra ou mar
mostrasse num rastro
o que pôde o azar
dentre os rumos tantos
um rumo lhe dar.
[…]
SOUSA, Afonso Felix de. Nova antologia poética. Goiânia:
Cegraf/UFG, 1991. p. 84-86.
O poema “Romance de Itapoã”, do qual foram extraídos os fragmentos
acima, forma com “Toada Goiana”, “O poço da roda”, “Toada do enjeitado”, “A
noiva do sobrado” e “A moça de Goiatuba” uma série cuja unidade é conferida
pela
(A) exploração de temas e espaços míticos.
(B) utilização de narrador, enredo e personagens.
(C) representação idealizada do tempo presente.
(D) personificação de seres da natureza.
(E) evocação de elementos da memória afetiva.
Leia também:
UFG - 2001 - 1º Fase - Prova de Língua Portuguesa
Conheça as apostilas de literatura do blog Veredas da Língua. Clique em uma das imagens abaixo e saiba como adquiri-las.
ATENÇÃO: Além das apostilas, o aluno recebe também, GRATUITAMENTE, o programa em Powerpoint: 500 TEMAS DE REDAÇÃO
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário