Perguntaram-me
se acredito em Deus...
Acabo de publicar um livrinho com o título Perguntaram-me
se acredito em Deus… Ele nasceu de uma pergunta que me fez uma senhora, ao
final de um debate sobre educação. Essa foi a pergunta que ela me fez: “O
senhor acredita em Deus?”
Houve tempo em que era mais fácil
acreditar em Deus. Hoje está mais difícil. Até o Papa, na sua visita ao campo
de concentração de Treblinka, fez a pergunta que não deveria ter feito: “Onde
estava Deus quando esse horror aconteceu?”
Se for levada a sério a pergunta do Papa é
uma heresia. Deus não podia estar lá porque, se estivesse, ele não teria
deixado aquele horror acontecer. Pois Deus não é amor? E todo poderoso? Se
estava lá e deixou acontecer ou não é amor ou não é todo poderoso. Se ele não
estava lá então ele não é onipresente. Até o representante de Deus na Terra
ficou perturbado com a indiferença do seu Chefe.
Depois do atentado terrorista ao World
Trade Center o New York Times publicou um artigo com essa mesma
pergunta: Onde estava Deus? Estava lá? Se estava lá, por que deixou acontecer?
Fiquei com vontade de escrever um artigo dando uma resposta à pergunta
americana: “Deus estava no mesmo lugar onde estava quando a bomba atômica foi
lançada sobre Hiroshima…”
Dietrich Bonhoffer, pastor protestante que
foi enforcado por haver participado de um frustrado atentado para assassinar
Hitler – (Às vezes não há como fugir: ou matar um único, para que muitos não
sejam mortos, ou, para preservar a pureza pessoal, não matar esse único e
deixar que milhares sejam mortos; por vezes a inocência é mais criminosa que o
crime…) – lutou com essa pergunta: “Onde está Deus?” Sua resposta foi simples:
“Ele está aqui mas não é todo poderoso; Deus é fraco…”
Se Deus existe e é forte, como perdoá-lo
por permitir que acontecesse o que não deveria ter acontecido? Mas se Deus é
fraco ou não existe, então é possível perdoá-lo e amá-lo. Aí choraríamos e
diríamos: “Se Deus existisse ou fosse forte isso não teria acontecido…”
Mas eu não disse nada disso para a
senhora. Apenas perguntei de volta, pedindo um esclarecimento: “Qual? Há
tantos deuses… Os homens ferozes e vingativos imaginam um Deus feroz e
vingativo que mantém, para sua própria alegria, uma câmara de torturas
chamada Inferno onde se vinga dos seus desafetos por toda a eternidade. Há
o Deus jardineiro que criou um Paraiso e mora nas árvores e nas correntes
cristalinas. Há o Deus com alma de banqueiro que contabiliza débitos e
créditos… Há o Deus da Cecília Meireles que se confunde com as águas do mar
azul… Há o Deus erótico que inspira poemas de amor carnal… E há também o Deus
criança de Alberto Caeiro e Mário Quintana. Qual deles?”
Ela ficou em silêncio, meio perdida. Acho
que ela nunca havia pensado no que lhe disse. Então lhe respondi com os versos
do Chico:
“Saudade é o revés do parto. É arrumar o
quarto para o filho que já morreu”.
E perguntei: “Qual é a mãe que mais ama?
A que arruma o quarto para o filho que chegará amanhã ou a que arruma o quarto
para o filho que nunca chegará?” E acrescentei: “Sou um construtor de
altares à beira de um abismo. Construo meus alteres com poesia e beleza. Os
fogos que acendo nos meus altares iluminam o meu rosto e aquecem o meu corpo.
Mas o abismo continua escuro e silencioso…”
(Rubem
Alves)
“O menino que carregava água na peneira” – Manoel de Barros
“Receita de domingo” – Paulo Mendes Campos
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