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terça-feira, 27 de setembro de 2016

Tema de redação – UEMA – 2010

Tema de redação – UEMA – 2010

PRODUÇÃO TEXTUAL

Leia os textos com atenção:

TEXTO I - O paulistano Sílvio de Abreu é um noveleiro experiente. [...] Como todo autor de um folhetim bem sucedido, Abreu conseguiu entrar em sintonia com as preocupações e os interesses de uma ampla fatia da sociedade brasileira. Ele se confessa chocado, porém, com a descoberta de que o público mudou seu modo de encarar os desvios de conduta dos personagens. [...]

VEJA - A novela Belíssima chegou ao sucesso com personagens ambíguas. Por que deu certo sua trama?
ABREU - Considero que incluir a ambiguidade moral numa trama é um grande avanço. Personagens desse tipo fazem o público pensar. Ao analisar as causas dessa aceitação, contudo, confesso que fiquei chocado. Como sempre acontece na Globo, realizamos uma pesquisa com os espectadores para ver como o público estava absorvendo a trama e constatamos que uma parcela considerável deles já não valoriza tanto a retidão de caráter. Para eles, fazer o que for necessário para se realizar na vida é o certo. Esse encontro com o público me fez pensar que a moral do país está em frangalhos.

Revista Veja. Entrevista. 21 jun 2009.

TEXTO II - Como colunista, observo e comento a realidade. O quadro não anda muito animador, embora na crise mundial o Brasil parece estar se saindo melhor que a maioria dos países. De tirar o chapéu, se isso se concretizar e perdurar. Do ponto de vista da moralidade, por outro lado, até em instituições públicas que julgamos venerandas, a cada dia há um novo espanto. Não por obra de todos os que lá foram colocados (por nós), mas o que ficamos sabendo é dificíl de acreditar. Teríamos de andar feito o velho filósofo grego Diógenes, que percorria as ruas em dia claro com uma lanterna na mão. Questionado, respondia procurar um homem honrado. [...]
                A sorte é que apesar de tudo o país anda, a grande maioria de nós labuta na sua vidinha, trabalhando, pagando contas, construíndo casas, ruas e pontes e amores e família legais. Lutamos para ser pessoas decentes, as que carregam nas costas o mundo de verdade [...]

Lya Luft. In: http://veja.abril.uol.com.br/outra-epidemia. Acesso em 11 set 2009.

INSTRUÇÕES

Considerando que os textos têm apenas caráter motivador e servem como ponto inicial de reflexão, redija um texto dissertativo, desenvolvendo argumentos compatíveis com o ponto de vista escolhido, com, no mínimo, 20 linhas como resposta ao questionamento decorrente das ideias dos autores citados. Dê um título a sua redação.

TEMA: A MORAL ESTÁ TORTA  INSTALOU-SE ENTRE NÓS UMA EPIDEMIA MORAL?

INFORMAÇÕES
O candidato deve:
- obedecer, obrigatoriamente, ao tema e à tipologia textual indicados;
- articular suas próprias informações às ideias apresentadas nos fragmentos motivadores, desenvolvendo seu ponto de vista, de modo a justificar a que conclusão pretende chegar, mantendo, assim, uma coerência argumentativa;
- obedecer ao que consta no Edital nº 105/2009-PROG/UEMA a respeito da correção da Produção Textual:


Será atribuída nota zero à prova de Produção Textual (redação) do candidato que: identificar a folha destinada a sua produção textual; desenvolver texto sob forma não-articulada verbalmente (apenas com números, desenhos, palavras soltas); fugir à temática proposta ou sugerida na prova de produção textual; escrever de forma ilegível ou a lápis; escrever menos de vinte linhas na folha de redação; desenvolver o texto em forma de verso.”


Leia também:

Texto: “Alvoroço de festa no céu” — Clarice Lispector

Alvoroço de festa no céu

Não é que na véspera do Carnaval houve no céu uma festa para os bichos da selva?
Os convites foram entregues por um beija-flor que delicadamente os deixava em cima de corolas de vitorias-regias. O bicho que ia passando via o seu nome no envelope e pulava de alegria: tinha sido contemplado com um programa para o fim de semana!
Mas notaram todos que só recebiam convites os bichos de asa. O que era uma injustiça. Pelo menos foi o que o sapo gordo pensou. Os animais de terra estavam conformados, esperando o dia em que houvesse a festa lá na selva mesmo. Mas, como eu disse, o sapo verde não. Todos riam dele e de suas reclamações coaxadas e inúteis.
Ele aproveitou o fim manso de tarde para gritar bem alto e ser bem ouvido.
— Eu também vou!
Os pássaros caçoaram e perguntaram:
Cadê tuas asas, bicho feio?
Foi então que pensou: devo consultar quem é igual a mim, porém mais velho. E realmente, no brejo que ficava entre samambaias e avencas, encontrou um sapo velho e cheio de sabedoria chamado Quá-quáqua.
Este se amedrontou com as intenções do sapo jovem:
— Olhe, é melhor para a sua saúde não sair do chão e ter água por perto.
Então o sapo jovem disse-lhe:
— O senhor é capaz de guardar um segredo? Pois bem, eu vou dançar lá em cima. Basta-me que o urubu feio leve o seu violão.
Qua-qua-qua disse-lhe que não o entendia.
O sapo foi falar com o urubu:
— Você vai levar seu violão, urubu?
O urubu, de violão debaixo da asa, nem se dignou a responder.
— Senhor urubu, quer me fazer um único favor? O de ver se estou naquela esquina?
O urubu, meio burro, replicou que, já que era um só favor, ele iria. E não carregou o violão. O sapo mais que depressa entrou no violão e ficou lá bem quieto, embora tivesse uma vontade louca de fumar. O urubu voltou para lhe dizer que não o havia encontrado na esquina — mas cadê o sapo? Sumira, pensou. E pensou: agora vou para o céu.
Para encurtar a história, o sapo, dentro do violão, chegou ao céu e mais do que depressa pulou para fora e começou a dançar todo feliz. Os pássaros se espantaram, perguntaram ao senhor sapo como havia chegado. Mas a alma do negócio é o segredo e o sapo só respondeu malcriado:
— É que eu me arranjo sempre!
E entrou de novo sorrateiro no violão para ir embora. Mas o urubu percebeu a coisa e ficou raivoso:
Espertinho, não é? Pois agora mesmo é que você vai voar, vou te soltar no ar. Então o sapo pediu todo manhoso:
— Está vendo aquela pedra e aquele lago? Pelo amor de Deus, deixe eu cair na pedra porque se eu cair no lago eu me afogo!
— Pois é no lago que eu vou te largar, para você morrer!
O sapo, bem feliz, caiu no lago, e salvou-se.

Moral da festa? Bem, não houve.
  

(Clarice Lispector, in “Como nasceram as estrelas”)


Leia também:


"O siri higiênico" — Moacyr Scliar
"A Iara" — Monteiro Lobato


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domingo, 25 de setembro de 2016

Tema de redação – UMC – 2016

Tema de Redação – UMC – 2016


REDAÇÃO – UMC – 2016

Instruções:
A.
1. Leia, com atenção, a proposta.
2. Utilize o espaço destinado para fazer o rascunho da redação.
3. Antes de passar a redação para a folha definitiva, a caneta, leia as instruções impressas na mesma.

B. A redação deve seguir as seguintes instruções.
1. Seu texto deve ter aproximadamente 25 linhas;
2. Não se esqueça de dar um título sugestivo ao texto;
3.Não copie trechos dos excertos de textos;
4. Sua produção textual será avaliada com base nos seguintes critérios:
- Domínio da língua portuguesa culta;
- Compreensão da proposta de redação e domínio do gênero de texto solicitado;
- Seleção, organização e construção de argumentos em defesa de um ponto de vista sobre o tema proposto;
- Emprego de organizadores textuais necessários à construção da argumentação;
- Utilização adequada das marcas de segmentação textual: título, paragrafação, pontuação e outros sinais gráficos.

Observação: A redação valerá no máximo 100 pontos, sendo que cada critério especificado acima poderá atingir de zero a 20 pontos, desclassificando-se o candidato que totalizar pontuação menor que 20 ao final da avaliação.

Tema: "A utópica solidariedade humana"

            Você deve ler os textos de apoio.
            Para produzir o texto da redação, são propostos dois recortes desse tema, você deverá produzir, em prosa, um texto argumentativo, uma dissertação, ou texto narrativo, uma crônica.
            Escolha uma das duas propostas para redação (dissertação ou crônica) e indique sua escolha no alto da página da redação.
            Os textos de apoios são válidos, para as duas propostas. Leia todos e selecione o que julgar pertinente para a realização da proposta escolhida. Articule os elementos selecionados com sua experiência de leitura e reflexão.
            O uso de um ou mais textos de apoio é obrigatório.
            ATENÇÃO - sua redação será anulada se você desconsiderar os textos de apoio, ou fugir ao recorte temático, ou ainda, não atender ao gênero textual da proposta escolhida.

TEXTOS DE APOIO:

Texto 1 - Refugiados - a honra perdida da Europa

            A morte do menino sírio Aylan, que deu à costa numa praia da Turquia depois do barco em que viajava ter naufragado, comoveu o mundo, operou uma viragem no posicionamento de muitos líderes europeus e sobretudo gerou um movimento de solidariedade nas redes sociais que promete resgatar a honra perdida do velho continente.
            À ignomínia do arame farpado, dos cães e das cargas policiais, dos números inscritos nos braços a marcador, do sofrimento imposto nas fronteiras da Sérvia, da Grécia e da Hungria; ao desprezo pelas obrigações internacionais que decorrem dos tratados e convenções que os países da Europa subscreveram; à vergonha das declarações do primeiro ministro britânico David Cameron, comparando os migrantes a uma “praga”, sucede-se agora uma onda de simpatia por esses condenados da terra, acolhidos com aplausos, água e brinquedos à chegada à Alemanha, cuja chanceler Angela Merkel, depois de semanas de hesitação, já havia declarado estar disponível para acolher até 800 000 refugiados vindos da Síria.
            Berlim parece ter compreendido, melhor e mais cedo que as outras capitais europeias, que os refugiados, longe de serem apenas um problema, podem ser um activo – embaratecimento da força trabalho, reforço do sistema de segurança social e estímulo ao crescimento demográfico.
            Na Islândia, depois que uma jovem escritora endereçou uma carta aberta ao governo, pelo menos 10.000 pessoas – 4% da população - ofereceram as suas casas para acolher refugiados; na Finlândia, o próprio presidente colocou a moradia à disposição, num gesto destinado a incentivar a generosidade do resto do país e em Espanha, Madrid e Barcelona declararam-se cidades-refúgio, dando as boas-vindas aos imigrantes.           Ontem, domingo, o próprio Papa apelou às organizações católicas de toda a Europa para acolherem refugiados.
            Tudo isto, porém, não apaga, antes acentua, o sentimento de indiferença e incapacidade que decorre das declarações oficiais da UE, cujos líderes, no auge da crise, marcaram uma reunião “urgente” para daí a 15 dias, ou seja, apenas para 14 de Setembro!
            No seu conjunto, as instituições europeias – Conselho, Comissão e Parlamento – destituídas de um mínimo sentido de solidariedade e urgência à altura da tragédia de proporções bíblicas a que vimos assistindo, mostraram-se totalmente impreparadas para fazer face ao problema, não gerando até agora qualquer política de consenso minimamente coerente.
            Depois do escândalo dos naufrágios no Mediterrâneo, que já ceifaram dezenas de milhar de vidas, a muito custo, a UE tinha acordado receber este ano até 40.000 refugiados – número bastante reduzido face às necessidades, mas que mesmo assim se mostrava difícil de cumprir porque vários países levantavam objecções às quotas que lhes haviam sido destinadas.
            Agora, face ao súbito avolumar do problema, e à crescente indignação da opinião pública, que se acentuou depois da foto do menino sírio morto, a Comissão fala de uma meta de 120.000, três vezes mais do que o limite que a UE a si própria se havia imposto.
            Mais uma vez, os europeus parecem correr atrás do prejuízo – o Alto Comissariado da ONU para os refugiados já pediu que a UE abra espaço para pelo pelos 200.000 pessoas.
            Tudo indica, portanto, que as decisões europeias vão ser too little, too late – muito pouco, demasiado tarde. Depois de ser compelida a abrir caminho aos refugiados, a Hungria fala já de novo em fechar as fronteiras e prossegue na construção de um muro de 175 kms e 4 metros de altura na fronteira com a Sérvia.
            Por outro lado, longe de se questionar sobre as razões profundas da crise – a miséria extrema em que vivem milhões de pessoas e as guerras e intervenções militares no Médio Oriente, algumas das quais ela própria promoveu ou de que foi cúmplice – a UE mostra tendência para se concentrar apenas nas consequências, como a repressão ao tráfico de seres humanos que a onda migratória suscita. Ou seja, procura, quando muito, mitigar efeitos, em vez de tentar resolver problemas.
            Fica assim a dúvida: será a corrente de solidariedade suscitada pela foto do menino morto suficiente para resgatar a honra perdida da Europa?

(Carlos Fino, O Globo, 07/09/2015)

Texto 2 - Mãos dadas

Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.

Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins,
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente.

(Carlos Drummond de Andrade, 1940)

Texto 3 - Texto bíblico


As faltas contra a justiça e a caridade para com o próximo ou mesmo por omissão são apontadas como a causa do castigo, realçando, assim os gestos de solidariedade praticados para com o próximo que levam a uma recompensa positiva. Há, pois, um evidenciar das atitudes que Jesus espera que todos tomem; mais do que atitudes, diremos, Jesus espera do ser humano uma forma de estar na vida conforme aos ensinamentos que lhe dá, ensinamentos esses que se resumem nos dois mandamentos que deixou: Ama o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu entendimento e Ama ao teu próximo como a ti mesmo [Mat. 22: 37 e 39].



Leia também:
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Tema de redação – FATEC 2013 – 2º Semestre
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Tema de Redação - UFRJ - 2011



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quinta-feira, 22 de setembro de 2016

“O operário em construção” — Vinícius de Moraes

O operário em construção

E o Diabo, levando-o a um alto monte, mostrou-lhe num momento de tempo todos os reinos do mundo. E disse-lhe o Diabo: 

- Dar-te-ei todo este poder e a sua glória, porque a mim me foi entregue e dou-o a quem quero; portanto, se tu me adorares, tudo será teu. 

E Jesus, respondendo, disse-lhe: 

- Vai-te, Satanás; porque está escrito: adorarás o Senhor teu Deus e só a Ele servirás. 

Lucas, cap. V, vs. 5-8. 

Era ele que erguia casas  
"Operários". 1933. Tarsila do Amaral.

Onde antes só havia chão. 
Como um pássaro sem asas 
Ele subia com as casas 
Que lhe brotavam da mão. 
Mas tudo desconhecia 
De sua grande missão: 
Não sabia, por exemplo 
Que a casa de um homem é um templo 
Um templo sem religião 
Como tampouco sabia 
Que a casa que ele fazia 
Sendo a sua liberdade 
Era a sua escravidão. 

De fato, como podia 
Um operário em construção 
Compreender por que um tijolo 
Valia mais do que um pão? 
Tijolos ele empilhava 
Com pá, cimento e esquadria 
Quanto ao pão, ele o comia... 
Mas fosse comer tijolo! 
E assim o operário ia 
Com suor e com cimento 
Erguendo uma casa aqui 
Adiante um apartamento 
Além uma igreja, à frente 
Um quartel e uma prisão: 
Prisão de que sofreria 
Não fosse, eventualmente 
Um operário em construção. 

Mas ele desconhecia 
Esse fato extraordinário: 
Que o operário faz a coisa 
E a coisa faz o operário. 
De forma que, certo dia 
À mesa, ao cortar o pão 
O operário foi tomado 
De uma súbita emoção 
Ao constatar assombrado 
Que tudo naquela mesa 
- Garrafa, prato, facão - 
Era ele quem os fazia 
Ele, um humilde operário, 
Um operário em construção. 
Olhou em torno: gamela 
Banco, enxerga, caldeirão 
Vidro, parede, janela 
Casa, cidade, nação! 
Tudo, tudo o que existia 
Era ele quem o fazia 
Ele, um humilde operário 
Um operário que sabia 
Exercer a profissão. 

Ah, homens de pensamento 
Não sabereis nunca o quanto 
Aquele humilde operário 
Soube naquele momento! 
Naquela casa vazia 
Que ele mesmo levantara 
Um mundo novo nascia 
De que sequer suspeitava. 
O operário emocionado 
Olhou sua própria mão 
Sua rude mão de operário 
De operário em construção 
E olhando bem para ela 
Teve um segundo a impressão 
De que não havia no mundo 
Coisa que fosse mais bela. 

Foi dentro da compreensão 
Desse instante solitário 
Que, tal sua construção 
Cresceu também o operário. 
Cresceu em alto e profundo 
Em largo e no coração 
E como tudo que cresce 
Ele não cresceu em vão 
Pois além do que sabia 
- Exercer a profissão - 
O operário adquiriu 
Uma nova dimensão: 
A dimensão da poesia. 

E um fato novo se viu 
Que a todos admirava: 
O que o operário dizia 
Outro operário escutava. 

E foi assim que o operário 
Do edifício em construção 
Que sempre dizia sim 
Começou a dizer não. 
E aprendeu a notar coisas 
A que não dava atenção: 

Notou que sua marmita 
Era o prato do patrão 
Que sua cerveja preta 
Era o uísque do patrão 
Que seu macacão de zuarte 
Era o terno do patrão 
Que o casebre onde morava 
Era a mansão do patrão 
Que seus dois pés andarilhos 
Eram as rodas do patrão 
Que a dureza do seu dia 
Era a noite do patrão 
Que sua imensa fadiga 
Era amiga do patrão. 

E o operário disse: Não! 
E o operário fez-se forte 
Na sua resolução. 

Como era de se esperar 
As bocas da delação 
Começaram a dizer coisas 
Aos ouvidos do patrão. 
Mas o patrão não queria 
Nenhuma preocupação 
- "Convençam-no" do contrário - 
Disse ele sobre o operário 
E ao dizer isso sorria. 

Dia seguinte, o operário 
Ao sair da construção 
Viu-se súbito cercado 
Dos homens da delação 
E sofreu, por destinado 
Sua primeira agressão. 
Teve seu rosto cuspido 
Teve seu braço quebrado 
Mas quando foi perguntado 
O operário disse: Não! 

Em vão sofrera o operário 
Sua primeira agressão 
Muitas outras se seguiram 
Muitas outras seguirão. 
Porém, por imprescindível 
Ao edifício em construção 
Seu trabalho prosseguia 
E todo o seu sofrimento 
Misturava-se ao cimento 
Da construção que crescia. 

Sentindo que a violência 

Kathe Kollwitz.
Não dobraria o operário 
Um dia tentou o patrão 
Dobrá-lo de modo vário. 
De sorte que o foi levando 
Ao alto da construção 
E num momento de tempo 
Mostrou-lhe toda a região 
E apontando-a ao operário 
Fez-lhe esta declaração: 
- Dar-te-ei todo esse poder 
E a sua satisfação 
Porque a mim me foi entregue 
E dou-o a quem bem quiser. 
Dou-te tempo de lazer 
Dou-te tempo de mulher. 
Portanto, tudo o que vês 
Será teu se me adorares 
E, ainda mais, se abandonares 
O que te faz dizer não. 

Disse, e fitou o operário 
Que olhava e que refletia 
Mas o que via o operário 
O patrão nunca veria. 
O operário via as casas 
E dentro das estruturas 
Via coisas, objetos 
Produtos, manufaturas. 
Via tudo o que fazia 
O lucro do seu patrão 
E em cada coisa que via 
Misteriosamente havia 
A marca de sua mão. 
E o operário disse: Não! 

- Loucura! - gritou o patrão 
Não vês o que te dou eu? 
- Mentira! - disse o operário 
Não podes dar-me o que é meu. 

E um grande silêncio fez-se 
Dentro do seu coração 
Um silêncio de martírios 
Um silêncio de prisão. 
Um silêncio povoado 
De pedidos de perdão 
Um silêncio apavorado 
Com o medo em solidão. 

Um silêncio de torturas 
E gritos de maldição 
Um silêncio de fraturas 
A se arrastarem no chão. 
E o operário ouviu a voz 
De todos os seus irmãos 
Os seus irmãos que morreram 
Por outros que viverão. 
Uma esperança sincera 
Cresceu no seu coração 
E dentro da tarde mansa 
Agigantou-se a razão 
De um homem pobre e esquecido 
Razão porém que fizera 
Em operário construído 
O operário em construção.


(Vinícius de Moraes)

www.veredasdalingua.blogspot.com.br

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"O tempo é um fio" — Henriqueta Lisboa
"Alvoroço de festa no céu" — Clarice Lispector



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