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segunda-feira, 31 de março de 2014

Ricardo Reis (heterônimo de Fernando Pessoa)

Ricardo Reis (heterônimo de Fernando Pessoa)

A Cada Qual

A cada qual, como a 'statura, é dada
A justiça: uns faz altos
O fado, outros felizes.
Nada é prêmio: sucede o que acontece.
Nada, Lídia, devemos
Ao fado, senão tê-lo.

(Ricardo Reis)

Anjos ou Deuses

Anjos ou deuses, sempre nós tivemos,
A visão perturbada de que acima
De nos e compelindo-nos
Agem outras presenças.
Como acima dos gados que há nos campos
O nosso esforço, que eles não compreendem,
Os coage e obriga
E eles não nos percebem,
Nossa vontade e o nosso pensamento
São as mãos pelas quais outros nos guiam
Para onde eles querem E nós não desejamos.

(Ricardo Reis)

Cada Coisa

Cada coisa a seu tempo tem seu tempo.
Não florescem no inverno os arvoredos,
Nem pela primavera Têm branco frio os campos.
À noite, que entra, não pertence, Lídia,

O mesmo ardor que o dia nos pedia.
Com mais sossego amemos A nossa incerta vida.
À lareira, cansados não da obra
Mas porque a hora é a hora dos cansaços, 
Não puxemos a voz Acima de um segredo,
E casuais, interrompidas, sejam
Nossas palavras de reminiscência
(Não para mais nos serve A negra ida do Sol) — 
Pouco a pouco o passado recordemos
E as histórias contadas no passado
Agora duas vezes Histórias, que nos falem
Das flores que na nossa infância ida 
Com outra consciência nós colhíamos
E sob uma outra espécie
De olhar lançado ao mundo.
E assim, Lídia, à lareira, como estando, 
Deuses lares, ali na eternidade,
Como quem compõe roupas
O outrora compúnhamos 
Nesse desassossego que o descanso
Nos traz às vidas quando só pensamos
Naquilo que já fomos, E há só noite lá fora.

(Ricardo Reis)

Lídia

Lídia, ignoramos. Somos estrangeiros
Onde que quer que estejamos.
Lídia, ignoramos. Somos estrangeiros
Onde quer que moremos, Tudo é alheio
Nem fala língua nossa.
Façamos de nós mesmos o retiro
Onde esconder-nos, tímidos do insulto
Do tumulto do mundo.
Que quer o amor mais que não ser dos outros?
Como um segredo dito nos mistérios,
Seja sacro por nosso.
Ninguém a Outro Ama
Ninguém a outro ama, senão que ama
O que de si há nele, ou é suposto.
Nada te pese que não te amem. Sentem-te
Quem és, e és estrangeiro.
Cura de ser quem és, amam-te ou nunca.
Firme contigo, sofrerás avaro
De penas.

(Ricardo Reis)


Para ser grande, sê inteiro: nada
 Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim, em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.

(Ricardo Reis)

www.veredasdalingua.blogspot.com.br

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Álvaro de Campos (heterônimo de Fernando Pessoa) – Poemas
“Menor perverso” – Olavo Bilac
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