AUGUSTO DOS ANJOS
- Nasceu na Paraíba, em 1884, e faleceu em Minas Gerais, em 1914.
- Em vida publicou um único livro: “Eu”
- Após sua morte, outros poemas do autor são adicionados ao livro,que passa a se chamar “Eu e outras poesias”.
Características de sua poesia:
- Poeta situado no Pré-Modernismo brasileiro.
- Carrega heranças simbolistas, parnasianas, naturalistas e realistas e, ao mesmo tempo, traz inovações próprias do Modernismo, sendo um poeta de difícil classificação.
- Uso de termos científicos.
- Uma angústia profunda ante a morte e a decomposição da carne é uma das tônicas de sua poesia.
- Pessimismo exacerbado.
- Vocabulário singular, sendo considerado pelos críticos de então como de “mau gosto”.
- Centra-se na dor, que para o poeta é universal e abrangente.
O poeta do hediondo
Sofro aceleradíssimas pancadas
No coração. Ataca-me a existência
A mortificadora coalescência
Das desgraças humanas congregadas!
Em alucinatórias cavalgadas,
Eu sinto, então, sondando-me a consciência
A ultra-inquisitorial clarividência
De todas as neuronas acordadas!
Quanto me dói no cérebro esta sonda !
Ah ! Certamente eu sou a mais hedionda
Generalização do desconforto...
Eu sou aquele que ficou sozinho
Cantando sobre os ossos do caminho
A poesia de tudo quanto é morto!
Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
(Augusto dos Anjos)
Versos a um Coveiro
Numerar sepulturas e carneiros,
Reduzir carnes podres a algarismos,
Tal é, sem complicados silogismos,
A aritmética hedionda dos coveiros!
Um, dois, três, quatro, cinco... Esoterismos
Da Morte! E eu vejo, em fúlgidos letreiros,
Na progressão dos números inteiros
A gênese de todos os abismos!
Oh! Pitágoras da última aritmética,
Continua a contar na paz ascética
Dos tábidos carneiros sepulcrais:
Tíbias, cérebros, crânios, rádios e úmeros,
Porque, infinita como os próprios números,
A tua conta não acaba mais!
(Augusto dos Anjos)
Meia-noite. Ao meu quarto me recolho.
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.
"Vou mandar levantar outra parede..."
- Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre minha rede!
Pego de um pau. Esforços faço. Chego
A tocá-lo. Minh’alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!
A Consciência Humana é este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!
(Augusto dos Anjos)
Chama-se a Dor, e quando
passa, enluta
E todo mundo que por ela passa
Há de beber a taça da cicuta
E há de beber até o fim da taça!
E todo mundo que por ela passa
Há de beber a taça da cicuta
E há de beber até o fim da taça!
Há de beber, enxuto o olhar,
enxuta
A face, e o travo há de sentir, e a ameaça
Amarga dessa desgraçada fruta
Que é a fruta amargosa da Desgraça!
A face, e o travo há de sentir, e a ameaça
Amarga dessa desgraçada fruta
Que é a fruta amargosa da Desgraça!
E quando o mundo todo
paralisa
E quando a multidão toda agoniza,
Ela, inda altiva, ela, inda o olhar sereno
E quando a multidão toda agoniza,
Ela, inda altiva, ela, inda o olhar sereno
De agonizante multidão
rodeada,
Derrama em cada boca envenenada
Mais uma gota do fatal veneno!
Derrama em cada boca envenenada
Mais uma gota do fatal veneno!
(Augusto dos Anjos)
Vencedor
Toma as espadas rútilas,
guerreiro,
E à rutilância das espadas, toma
A adaga de aço, o gládio de aço, e doma
Meu coração - estranho carniceiro!
Não podes?! Chama então presto o primeiro
E o mais possante gladiador de Roma.
E qual mais pronto, e qual mais presto assoma,
Nenhum pôde domar o prisioneiro.
Meu coração triunfava nas arenas.
Veio depois um domador de hienas
E outro mais, e, por fim, veio um atleta,
Vieram todos, por fim; ao todo, uns cem...
E não pôde domá-lo, enfim, ninguém,
Que ninguém doma um coração de poeta!
(Augusto dos Anjos)
E à rutilância das espadas, toma
A adaga de aço, o gládio de aço, e doma
Meu coração - estranho carniceiro!
Não podes?! Chama então presto o primeiro
E o mais possante gladiador de Roma.
E qual mais pronto, e qual mais presto assoma,
Nenhum pôde domar o prisioneiro.
Meu coração triunfava nas arenas.
Veio depois um domador de hienas
E outro mais, e, por fim, veio um atleta,
Vieram todos, por fim; ao todo, uns cem...
E não pôde domá-lo, enfim, ninguém,
Que ninguém doma um coração de poeta!
(Augusto dos Anjos)
Metade pássaro
A mulher do fim do mundo
Dá de comer as roseiras
Dá de beber as estátuas
Dá de sonhar aos poetas.
A mulher do fim do mundo
Chama a luz com um assobio,
Faz a virgem virar pedra,
Cura a tempestade,
Desvia o curso dos sonhos
escreve cartas ao rio,
Me puxa do sono eterno
Para os seus braços que cantam.
(Augusto dos Anjos)
A Louca
A Louca
A Dias Paredes
Quando ela passa: - a veste
desgrenhada,
O cabelo revolto em desalinho,
No seu olhar feroz eu adivinho
O mistério da dor que a traz penada.
O cabelo revolto em desalinho,
"Mad Kate". Henry Fuseli. |
No seu olhar feroz eu adivinho
O mistério da dor que a traz penada.
Moça, tão moça e já desventurada;
Da desdita ferida pelo espinho,
Vai morta em vida assim pelo caminho,
No sudário de mágoa sepultada.
Da desdita ferida pelo espinho,
Vai morta em vida assim pelo caminho,
No sudário de mágoa sepultada.
Eu sei a sua história. - Em
seu passado
Houve um drama d’amor misterioso
- O segredo d’um peito torturado –
Houve um drama d’amor misterioso
- O segredo d’um peito torturado –
E hoje, para guardar a mágoa
oculta,
Canta, soluça - coração saudoso,
Chora, gargalha, a desgraçada estulta.
Canta, soluça - coração saudoso,
Chora, gargalha, a desgraçada estulta.
(Augusto dos Anjos)
Soneto
Pareceu-me inda ouvir o nome dela
No badalar monótono dos
sinos.
Hermeto Lima
Adeus, adeus, adeus! E,
suspirando,
Saí deixando morta a minha amada,
Vinha o luar iluminando a estrada
E eu vinha pela estrada soluçando.
Saí deixando morta a minha amada,
Vinha o luar iluminando a estrada
E eu vinha pela estrada soluçando.
Perto, um ribeiro claro
murmurando
Muito baixinho como quem chorava,
Parecia o ribeiro estar chorando
As lágrimas que eu triste gotejava.
Muito baixinho como quem chorava,
Parecia o ribeiro estar chorando
As lágrimas que eu triste gotejava.
Súbito ecoou do sino o som
profundo!
Adeus! - eu disse. Para mim no mundo
Tudo acabou-se, apenas restam mágoas.
Adeus! - eu disse. Para mim no mundo
Tudo acabou-se, apenas restam mágoas.
Mas no mistério astral da
noute bela
Pareceu-me inda ouvir o nome dela
No marulhar monótono das águas!
Pareceu-me inda ouvir o nome dela
No marulhar monótono das águas!
(Augusto dos Anjos)
Soneto
A praça estava cheia. O condenado
Transpunha nobremente o cadafalso,
Puro de crime, isento de pecado,
Vítima augusta de indelével falso.
Transpunha nobremente o cadafalso,
Puro de crime, isento de pecado,
Vítima augusta de indelével falso.
E na atitude do Crucificado,
O olhar azul pregado n’amplidão,
Pude rever naquele desgraçado
O drama lutuoso da Paixão.
O olhar azul pregado n’amplidão,
Pude rever naquele desgraçado
O drama lutuoso da Paixão.
Quando do algoz cruento o
braço alçado
Se dispunha a vibrar sem compaixão
O golpe na cabeça do culpado
Se dispunha a vibrar sem compaixão
O golpe na cabeça do culpado
Ele, o algoz - o criminoso -
então,
Caiu na praça como fulminado
A soluçar: perdão, perdão, perdão!
Caiu na praça como fulminado
A soluçar: perdão, perdão, perdão!
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