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sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Texto: “O amor é reciclável” – Moacyr Scliar

O amor é reciclável

Notícia:

Casal britânico paga lua-de-mel com lixo reciclado.

Um casal britânico passou três meses recolhendo lixo para pagar as passagens aéreas de uma viagem de lua-de-mel para os Estados Unidos. John e Ann Till recolheram milhares de latas e garrafas nas ruas da cidade em que vivem, Petersfield, para levar a um centro de reciclagem em um supermercado da rede Tesco, que troca o material por milhas aéreas. "Queríamos uma lua-de-mel especial e estávamos tentando encontrar formas de arranjar dinheiro para isso", diz John Till, 31. Os dois recolheram o lixo quase todas as noites, durante três meses. "Eu me lembro de que estava nevando uma noite e fazia muito frio, mas ali estávamos, firmes", conta Ann. Eles afirmam que ficaram satisfeitos em ter recolhido o material reciclável para uma boa causa. 

Folha Online

Crônica:

"Os noivos no céu de Paris". Marc Chagall.
Não poderia haver no mundo pessoas mais felizes do que o casal que partia para a lua-de-mel nos Estados Unidos. Eles tinham muitas razões para estarem felizes. Primeiro, claro, porque era lua-de-mel, a culminância de muitos anos de namoro e depois de noivado; depois, porque tinham conseguido o dinheiro para a viagem recolhendo produtos recicláveis. O que, além de ter resultado numa grande solução – pobres, jamais poderiam ter pago as passagens para Nova York –, representava também uma contribuição muito valiosa para a causa da preservação ambiental, da qual ambos, militantes ecológicos, eram fervorosos adeptos. "Estamos começando nossa vida conjugal da melhor maneira possível", disse ele, quando embarcaram no avião. Com o que ela concordou, radiante. Sim, a vida conjugal começou bem: a lua-de-mel em Nova York foi maravilhosa, passearam no Central Park, foram a museus e a vários espetáculos na Broadway. 
Mas tudo termina, inclusive a lua-de-mel, e um dia tiveram de voltar para casa. E aí começou a vida de casados propriamente dita. Que não era muito fácil. Ambos tinham empregos modestos, ambos trabalhavam muito e ganhavam pouco. Mas isso não era o pior. O pior foi descobrir que viver a dois não é uma coisa fácil. Partilhar um quarto (minúsculo), partilhar um banheiro (minúsculo) implicava problemas que não tinham imaginado. Logo as discussões e as brigas começaram. Um ano depois, estavam se separando. Cada um voltou para a casa dos pais, na pequena cidade em que moravam, ambos sofrendo muito, ele, principalmente. Chorava lembrando os bons tempos de namoro e de noivado; mas chorava principalmente lembrando as noites em que, com a noiva, percorria as ruas desertas em busca de latas de refrigerantes e de garrafas plásticas.
Uma noite, não agüentou: saltou da cama, vestiu-se, e saiu. Estava nevando, mas isso não importava; ele queria, como naqueles bons tempos, recolher produtos descartáveis. Não tinha andado três quarteirões, na rua deserta, quando, de repente, avistou alguém juntando uma lata de refrigerante da rua. Era ela, naturalmente. Caíram nos braços um do outro. E agora saem todas as noites para sua expedição ecológica. Não sabem ainda para onde vão viajar, mas sabem que será uma segunda, e feliz, lua-de-mel.

(Moacyr Scliar, crônica para o jornal Folha de S. Paulo, 13 de outubro de 2008)


Leia também:
"Meus oito anos" - Casimiro de Abreu
"O milagre das folhas" - Clarice Lispector
"A morte dos girassóis" - Caio Fernando Abreu


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