Prova
de Língua e Literatura em Língua Portuguesa – Cásper Líbero – 2010
1. Assinale a alternativa correta sobre Dom Casmurro, de Machado
de Assis.
a. O romance em si é um simples acidente, sendo fundamentais e orgânicas
na obra a descrição dos costumes e a filosofia social que lhe está implícita.
b. Com este romance o escritor faz a liquidação dos saldos do Segundo
Reinado e estabelece o divisor de águas entre o tipo patriarcal e o tipo
burguês de civilização, representados no terreno da organização política,
respectivamente, pela Monarquia e pela República.
c. Romance complexo e ambicioso, Dom Casmurro faz um estudo da
desagregação psicológica do protagonista, cuja loucura é tratada com agudeza
humorística.
d. A situação criada no romance já é por si mesma absurda, sugerindo uma
espécie de mascarada confessa, em que o verdadeiro autor ajusta ou retira a máscara
nas barbas do leitor, como quem não leva a sério os compromissos de artífice, isto é,
fabricando uma ilusão romanesca e criando um ambiente que dê aos leitores certo
simulacro de vida a evolver no tempo.
e. Por meio de um discurso ordenado e lógico, o protagonista procura
resolver sua angústia existencial, incorrendo em duas falácias, ao estabelecer
sua verdade: do ponto de vista estritamente jurídico, peca por basear sua
persuasão no verossímil e, do ponto de vista moral-religioso, por sustentar
suas justificativas pelo provável.
2. Assinale a alternativa que apresenta a análise crítica do excerto do
capítulo XXXIII (“O penteado”), de Dom Casmurro, de Machado de Assis,
apresentado a seguir.
– Pronto!
– Estará bom?
– Veja no espelho.
Em vez de ir ao espelho, que pensais que fez Capitu? Não vos esqueçais
que estava sentada, de costas para mim. Capitu derreou a cabeça, a tal
ponto, que me foi preciso acudir com as mãos e ampará-la; o espaldar da cadeira era
baixo. Inclinei-me depois sobre ela, rosto a rosto, mas trocados, os olhos de um na linha
da boca do outro. Pedi-lhe que levantasse a cabeça, podia ficar tonta, machucar
o pescoço. Cheguei a dizer-lhe que estava feia; mas nem esta razão a moveu.
– Levanta, Capitu!
Não quis, não levantou a cabeça, e ficamos assim a olhar um para o
outro, até que ela abrochou os lábios, eu desci os meus, e...
a. Quase toda a obra de Machado de Assis é um pretexto para o improviso
de borboleteios maliciosos, digressões e parênteses felizes. (Augusto Meyer).
b. Que excelente, e penetrante, e fino estudo da mulher nos deu, como a
brincar, recobrindo-o de riso e de ironia, o sr. Machado de Assis, nesta sua
Capitu! (José Veríssimo).
c. A problemática de Dom Casmurro ultrapassa, por assim dizer, o
esquema rígido das relações propostas apenas por este romance, pois não é só
ele que reflete o problema do amor/casamento/ciúme na sociedade patriarcal
brasileira. (Silviano Santiago).
d. A grande contribuição do humorismo na obra de Machado de Assis foi
permitir-lhe revelar as tacanhas proporções da sua gente sem resvalar nem para
a declamação nem para a caricatura. (Lúcia Miguel Pereira).
e. Na obra de Machado de Assis as mulheres são piores que os homens,
mais perversas. (Mário de Andrade).
3. Assinale a alternativa correta sobre Luuanda, de José Luandino
Vieira.
a. Nas três narrativas do livro, o leitor tem à disposição um precioso
trabalho com a linguagem que torce e retorce a língua portuguesa, explorando a
capacidade de refletir esse outro universo cultural que o escritor tem como
objeto de seu inquieto olhar.
b. A escolha do espaço está associada à opção por personagens que acabam
por se integrar à ordem que regula a sociedade colonial. Vavó Xixi e Zeca
Santos, seu neto; as vizinhas Bina e Zefa; o menino Beto; Xico Futa; Lomelino
dos Reis; Garrido e Inácia são personagens que organizam modos muito singulares
de sobrevivência.
c. O trabalho de elaboração da linguagem nas estórias é capaz de
preservar o mundo português da presença dos outros mundos que a cidade guarda,
abolidos pela prolongada e feroz dominação.
d. Ocupando quase sempre o papel de protagonistas da literatura
portuguesa, os angolanos cedem, por conta da complexidade cultural em que
estava imerso o país, lugar e voz nessas narrativas para os portugueses, que
estão dispostos a justificar o processo de colonização.
e. A alteração do nome da capital de Angola tem implicações na abordagem
do espaço que foi, desde muito cedo, um ponto fundamental no império lusitano.
O autor valoriza, assim, o ponto de vista dominante, o dos negros, mestiços e
brancos pobres que apagaram os vestígios da colonização portuguesa naquele
país.
4. Assinale a alternativa correta sobre o excerto da “Estória do ladrão
e do papagaio”, que integra o livro Luuanda, de José Luandino Vieira,
apresentado a seguir.
“Nem uazekele kié-uazeka kiambote, nem nada, era só assim a outra
maneira civilizada como ele dizia; mas também depois ficava na boa conversa de
patrícios e, então, aí o quimbundo já podia se assentar no meio de todas as
palavras, ele até queria, porque para falar bem-bem português não podia, o
exame da terceira é que estava lhe tirar agora e por isso não aceitava falar um
português de toda a gente, só queria falar o mais superior.”
a. Escrito em quimbundo, o texto registra expressões em português, a fim
de criar um estranhamento significativo para a compreensão da lógica que move o
livro.
b. A linguagem dos musseques (os bairros pobres de Luanda) é reproduzida
aqui fielmente, constituindo um precioso documento historiográfico que dá conta
de explicar a dominação portuguesa em Angola.
c. O esforço de recriação do registro escrito culto da linguagem pode
ser comparado ao de Guimarães Rosa e representa uma profunda reflexão sobre a
arte de contar histórias.
d. O português sólido e cerrado, mas ao mesmo tempo transparente, que
surge no texto está a serviço de registrar a história de um povo empenhado em
sua emancipação política e cultural.
e. Diante do texto, logo percebemos não estar em contato com um escritor
português. O
esforço de nacionalização da língua, que também se manifesta no recurso
a uma sintaxe
diferente, procura exprimir a ruptura com a norma lusitana e indiciar
outras rupturas que
precisam acontecer.
5. Assinale a alternativa correta sobre A rosa do povo, de Carlos
Drummond de Andrade.
a. Os poemas do livro constituem uma síntese definidora do que
representam as paisagens mineiras para o poeta, situado distante delas, mas
sentindo-as em si mesmo na cidade confusa e tumultuada.
b. A obra é o depoimento de um poeta menino modificado pelo tempo.
Assim, o menino faz-se antigo, colocando o presente e o passado numa
continuidade para distanciá-los.
c. Ao longo dos poemas, o poeta percorre o interior de versos sóbrios,
secos e contemplativos, mas impregnados de paixão e sentimento, baseado em uma
dualidade: a aristocracia da expressão e o esforço generoso para a compreensão
do que é popular.
d. O livro representa um sugestivo testemunho da luta que um poeta de
vanguarda tem de travar contra o conservadorismo ignorante, a inércia burguesa
e a estupidez instituída.
e. No conjunto de poemas, o poeta recupera o humorismo da fase inicial
de sua carreira e um interesse renovado pela anedota e pelo fato corrente,
tratados com relativa gratuidade.
6. Assinale a alternativa correta sobre os versos de “Carta a
Stalingrado”, poema que integra A rosa do povo, de Carlos Drummond de
Andrade, apresentados a seguir.
“A poesia fugiu dos livros, agora está nos jornais.
Os telegramas de Moscou repetem Homero.
Mas Homero é velho. Os telegramas cantam um mundo novo
que nós, na escuridão, ignorávamos.”
a. Escritos para celebrar o fim da Segunda Guerra, os versos tratam de
uma área geográfica ambígua e utópica, a província e o mundo, que oscila entre
o privado e o público, e que servirá de lastro para definir a força e o valor
do Brasil no contexto das nações.
b. Os versos retratam o engajamento de Drummond, pelo viés
ideológico-político, com as lutas revolucionárias no Brasil e no mundo afora,
aludindo alegoricamente à adesão do poeta ao Partido Comunista Brasileiro.
c. Os versos prestam uma homenagem à memória de Josef Stalin, lançando
questões relevantes para se discutir o papel político da palavra poética e o valor
estratégico da imaginação num mundo que se queria em paz.
d. Retratando o ambiente nacional tomado pela covardia e a demência, bem
como o ambiente internacional tomado por irmãos inimigos e sanguinários, os
versos rejeitam a palavra poética tradicional, celebrando, em seu lugar, a
força dos meios de comunicação.
e. Escritos durante a Segunda Guerra, os versos falam que os poemas
épicos de então estão sendo escritos pelo povo europeu em guerra contra o
nazi-fascismo, enquanto os brasileiros afundavam na retórica do Estado Novo e
no desconhecimento de um mundo novo que surgia.
7. Assinale a alternativa correta sobre Sagarana, de Guimarães
Rosa.
a. O tema do amor ocupa nas narrativas uma posição privilegiada,
aparecendo entrelaçado com o problema da natureza do mal, quando atinge extrema
complexidade por compor toda uma ideia erótica da vida.
b. Os contos compõem uma profissão de fé e uma arte poética em que o
escritor, através
de rodeios, voltas e perífrases, por meio de alegorias e parábolas,
analisa o seu gênero, o seu instrumento de expressão, a natureza da sua
inspiração, a finalidade da sua arte, de toda arte.
c. Os contos são as primeiras histórias de um Brasil novo. Assim, a
primeira e a última história se enlaçam pelo lugar que lhes serve de cenário
comum, percorrido pelo mesmo menino a aprender seus caminhos.
d. Os contos trazem certo espírito regional, mas transcendem a região
geográfica na qual as narrativas se desenvolvem. Assim, a província do autor é
menos uma região do Brasil do que uma região da arte, com detalhes, locuções,
vocabulário e geografia cosidos de maneira por vezes irreal, tamanha é a
concentração com que trabalha o autor.
e. Ao lado de admiráveis figuras de mulher, avulta na tipologia
literária dessas narrativas uma curiosa estirpe de personagens infantes de
extrema perspicácia e aguda sensibilidade, muitas vezes dotados de poderes
extraordinários, quando não possuem origem oculta ou vaga identidade.
8. Assinale a alternativa que apresenta a análise crítica do excerto do
conto “São Marcos”, integrante de Sagarana, de Guimarães Rosa, apresentado a
seguir.
“E era para mim um poema esse rol de reis leoninos, agora despojados da vontade
sanhuda e só representados na poesia. Não pelos cilindros de ouro e pedras, postos
sobre as reais comas riçadas, nem pelas alargadas barbas, entremeadas de fios
de ouro. Só, só por causa dos nomes.
Sim, que, à parte o sentido prisco, valia o ileso gume do vocábulo pouco
visto e menos ainda ouvido, raramente usado, melhor fora se jamais usado.
Porque, diante de um gravatá, selva moldada em jarro jônico, dizer-se apenas drimirim
ou amormeuzinho é justo; e, ao descobrir, no meio da mata, um
angelim que atira para cima cinqüenta metros de tronco e fronde, quem não terá
ímpeto de criar um vocativo absurdo e bradá-lo – Ó colossialidade! – na direção
da altura? E não é sem assim que as palavras têm canto e plumagem.”
a. É todo o interior do Brasil, e não apenas os “sertões do Urucuia”,
por suas paisagens, suas criaturas humanas, seus costumes e sua linguagem, que
vive em sua obra. (Tristão de Ataíde).
b. O escritor parece divertir-se e, todavia, comover-se com seus mitos,
tanto quanto o menino com seus brinquedos e o primitivo com suas superstições,
ao considerá-los objetos reais dentro ao reino em que vivem, o sobrenatural.
(Henriqueta Lisboa).
c. A metalinguagem encontra expressões variadas nos textos rosianos, que
se estendem desde a própria técnica até a inserção de toda uma reflexão teórica
sobre o processo de criação artística. (Eduardo Coutinho).
d. A sua obra, toda ela, compendia a história da realização heróica. Não
há herói possível sem um fundo interno de contemplação – sem uma orientação,
uma vontade, uma determinação de realizar os valores. (Franklin de Oliveira).
e. Nada mais natural, portanto, que, num escritor tão artista quanto
Guimarães Rosa, a busca do ritmo seja um problema constante em todos os
momentos da criação. (Ângela Vaz Leão).
9. Assinale a alternativa correta sobre O rei da vela, de Oswald
de Andrade.
a. A peça trata da constatação do fracasso da civilização criada pelas
gerações anteriores e a contemplação da massa amorfa de números em que é transformado o
homem pela sociedade de consumo.
b. A peça, cuja montagem marcou a evolução do Teatro Oficina, da fase
existencialista em direção ao engajamento social, conta a história de uma
família nos dias que antecedem a revolução de 30 no Brasil.
c. Concebida não como um espetáculo, mas como um sonho coletivo, a peça
tem como ancestral o anarquismo libertário, configurando uma obra na qual os
artistas exprimem a necessidade de transgredir as leis num marginalismo criador.
d. A peça está vinculada a uma estética acentuadamente politizada, cujos
carros-chefes são o anti-imperialismo, o anticapitalismo, a denúncia do
subdesenvolvimento e a defesa da justiça social.
e. A ideia central do texto é a de que a sociedade e a cultura funcionam
como um processo de esquizofrenia do indivíduo, conclamando os espectadores a
libertarem-se do sistema e a unirem corpo e mente num sentimento de libertação.
10. Assinale a alternativa correta sobre a fala de Abelardo II, em O
rei da vela, de
Oswald de Andrade, apresentada a seguir.
Abelardo II – A burguesia só produziu um teatro de classe. A
apresentação de classe. Hoje evoluímos. Chegamos à espinafração.
a. Trata-se de um recurso metalinguístico que define o programa
desenvolvido pela peça: a visão desmistificadora do país; o gosto demolidor de
todos os valores e a importância da estética da descompostura.
b. Trata-se do uso de expressões curiosas da comédia brasileira, que
prefere sempre escapar para a fantasia, guardando uma referência tácita à
realidade, vista através da sátira ou da farsa.
c. A fala reflete a observação viva e inteligente da realidade, por meio
de uma linguagem autêntica, vibrante e indignada ante os erros sociais.
d. Por meio dessa fala, o personagem propõe um grande painel histórico,
político e filosófico, condenando o mundo antigo em função do homem surgido do
proletariado triunfante.
e. A fala reflete a consciência da perda do mundo aristocrático, levando
o personagem a descrever outro instante de crise – o acelerado processo de
industrialização vivida pela metrópole paulistana a partir da Semana de 22.
11. Assinale a alternativa correta sobre A ilha, de Fernando
Morais.
a. Trata-se de um romance-reportagem que lança mão de uma inovadora
técnica de pesquisa, quando realiza exaustivo trabalho de coleta de fontes.
b. Trata-se de um livro-reportagem cuja técnica básica é a da
entrevista, que se propõe a observar um país em construção.
c. Trata-se de um ensaio jornalístico cujo autor mergulha nas
reminiscências dos habitantes de Cuba, disposto a recontar a história política
e intelectual daquele país.
d. Trata-se de uma pesquisa historiográfica que revela os bastidores do
regime cubano, tão pouco permeável ao grande público.
e. Trata-se de uma tese sociológica cujos capítulos mantêm entre si
unidade ideológica, metodológica e temática, ao examinar uma das nações mais emblemáticas do
século XX.
12. Assinale a alternativa que corrige, de acordo com a norma culta, o
conjunto dos textos publicitários.
a. Fórmula guardada há sete chaves. Por isso ninguém copia o sabor do
guaraná Amazonas./ Na sua vida existe muitos números. E o número do seu
colesterol você sabe qual é? Chegou a linha Bel./ Mantenha-se na pista.
Principalmente se for sábado à noite. Somatos. De bem com você./ Uma noite,
depois de curtir um tempo com minha filha, recebi a assessoria de um gerente
sobre meus investimentos. Foi aí que eu entendi o valor de ser cliente
Portinari.
b. Fórmula guardada a sete chaves. Por isso ninguém copia o sabor do
guaraná Amazonas./ Na sua vida existem muitos números. E o número do seu
colesterol você sabe qual é? Chegou a linha Bel./ Mantenha-se na pista.
Principalmente se for sábado a noite. Somatos. De bem com você./ Uma noite,
depois de curtir um tempo com minha filha, recebi a ascessoria de um gerente
sobre meus investimentos. Foi aí que eu entendi o valor de ser cliente
Portinari.
c. Fórmula guardada há sete chaves. Por isso ninguém copia o sabor do
guaraná Amazonas./ Na sua vida existem muitos números. E o número do seu
colesterol você sabe qual é? Chegou a linha Bel./ Mantenha-se na pista.
Principalmente se for sábado à noite. Somatos. De bem com você./ Uma noite,
depois de curtir um tempo com minha filha, recebi a assesçoria de um gerente
sobre meus investimentos. Foi aí que eu entendi o valor de ser cliente
Portinari.
d. Fórmula guardada a sete chaves. Por isso ninguém copia o sabor do
guaraná Amazonas./ Na sua vida existe muitos números. E o número do seu
colesterol você sabe qual é? Chegou a linha Bel./ Mantenha-se na pista.
Principalmente se for sábado a noite. Somatos. De bem com você./ Uma noite,
depois de curtir um tempo com minha filha, recebi a assessoria de um gerente
sobre meus investimentos. Foi aí que eu entendi o valor de ser cliente
Portinari.
e. Fórmula guardada a sete chaves. Por isso ninguém copia o sabor do
guaraná Amazonas./ Na sua vida existem muitos números. E o número do seu
colesterol, você sabe qual é? Chegou a linha Bel./ Mantenha-se na pista.
Principalmente se for sábado à noite. Somatos. De bem com você./ Uma noite,
depois de curtir um tempo com minha filha, recebi a assessoria de um gerente
sobre meus investimentos. Foi aí que eu entendi o valor de ser cliente
Portinari.
Leia o texto e responda às questões 13 e 14.
A maior estrela da
Festa Literária Internacional de Paraty é uma figura anacrônica. Se você não
conhece o jornalista e escritor Gay Talese, pode chegar a essa conclusão apenas
pela observação de suas roupas e sua postura altiva. Está sol e faz calor em Paraty,
mas Gay Talese só anda de terno. (...) O homem consegue ser a referência, mesmo
para os que não sabem nada sobre sua importância. Ele passa, e todos olham.
Ler sobre Talese apenas
aumenta a impressão de que ele não pertence ao mundo atual. Ele foi um dos
fundadores de uma maneira de reportar fatos chamada new journalism (novo
jornalismo). Nada mais é do que contar a realidade com o cuidado e o talento de
quem escreve um romance. Mesmo que o espaço seja um pequeno artigo de jornal.
Em seu perfil mais famoso, sobre o cantor Frank Sinatra, não falou com o
personagem principal. Observou-o durante uma noite inteira e ouviu todas as pessoas
comuns, anônimas, que o cercavam. Contou a história como quem descreve uma
cena. Como ficção.
Talese não entende a
internet e abomina o fato de que jovens jornalistas achem possível exercer a
profissão diante da tela de um computador. “Quando eles querem saber algo,
perguntam ao Google. Estão comprometidos apenas com as perguntas que fazem. Não
se chocam acidentalmente com nada que estimule a pensar ou a imaginar”, diz.
Sua doutrina é quem escuta muito e pergunta pouco. “Em nossa profissão, você
não precisa fazer perguntas. Basta ir às ruas e olhar as pessoas. É aí que você
descobre a vida como ela realmente é”, afirma. Para isso precisamos de tempo. E
a internet não tem tempo a perder.(...)
A cidade de Paraty olha
para Gay Talese com espanto. Mas o ponto de vista dele, de dentro de seu terno
com corte fino, embaixo de seu chapéu, é de quem acha que o mundo é que está diferente do que deveria ser. Em nenhum momento ele
se sente estranho, ou fora de moda, principalmente quando fala de sua maior
paixão: escrever
sobre a realidade. (Época, 6/7/2009).
13. Assinale a alternativa correta quanto ao sentido, à coerência e à
coesão.
a. Talese consegue ser uma referência sobretudo pela maneira exótica de
se vestir, mas o que o caracteriza é, sem dúvida, o cuidado na apuração dos
fatos, sendo que não se deixa trair pela imaginação, nem pelo senso de
realidade.
b. Para Talese, a melhor maneira de se construir a matéria jornalística
consiste em observar a realidade e imprimir-lhe certa dose de imaginação,
técnica que não deve contar com a interferência da internet.
c. Não que Talese não aceite a contribuição da internet, também ele
supõe que, indo às ruas, o jornalista pode ampliar mais as informações sobre a
matéria da qual se ocupa e que certamente muito terá a ganhar com a
contribuição das pessoas.
d. Como um dos fundadores do novo jornalismo, Talese está convicto do
impulso que a tecnologia poderá dar aos novos profissionais; portanto, instiga-os
também a sair às ruas para colher a melhor informação sobre o assunto a ser pesquisado.
e. Mesmo aos 77 anos, Talese está afinado com todos os avanços que a
tecnologia imprimiu à comunicação e, se é possível hoje elaborar matéria
jornalística de qualidade, sempre se pode dizer que é por causa dela que a
imprensa evoluiu.
14. Assinale a alternativa em que as preposições em destaque contêm, respectivamente,
os mesmos valores das preposições destacadas nas frases abaixo.
Nada
mais é do que contar a realidade com o cuidado e o talento de quem
escreve um romance.
Ler sobre
Talese apenas aumenta a impressão de que ele não pertence ao mundo atual. E
a internet não tem tempo a perder.
a. Para Talese, o jornalista deve buscar a verdade com paciência./
O homem consegue ser referência mesmo para os que não sabem nada sobre sua
importância./ As afirmações de Talese sobre a maneira de apurar os fatos levam a
pensar.
b. As lições de Talese podem ser recebidas com reserva pelos
novos jornalistas./ A matéria colocada sobre a mesa não se baseava na
realidade./ De ano a ano surge uma figura original como a de Talese.
c. O repórter vai às ruas falar com as pessoas./ Eram pessoas da
cidade, com histórias sobre os parentes que foram para a guerra./ De
Nova York a Paraty, a viagem do jornalista foi tranquila.
d. O jornalista deve conviver com as pessoas por quem está
interessado./ Sobre a cabeça dos jovens jornalistas devem cair as lições
de Talese./ Daqui a um ano, todos poderão aprender mais sobre o novo
jornalismo.
e. Andar com Talese pelas ruas de Paraty é ver o espanto no rosto
das pessoas./ É preciso perguntar às pessoas sobre a vida do
entrevistado/ Ele veio a Paraty para ensinar sobre a maneira de reportar
fatos chamada new journalism.
Leia o texto a seguir e responda às questões de 15 a 20.
Na linguagem cotidiana
a palavra trabalho tem muitos significados. Embora pareça compreensível, como uma das formas elementares de ação dos homens, o seu
conteúdo oscila. Às vezes, carregada de emoção, lembra dor, tortura, suor do
rosto, fadiga. Noutras, mais que aflição e fardo, designa a operação humana de
transformação da matéria natural em objeto de cultura. É o homem em ação para sobreviver e realizar-se,
criando instrumentos, e com esses, todo um novo universo cujas vinculações com
a natureza, embora inegáveis, se tornam opacas.
Em quase todas as
línguas da cultura europeia, trabalhar tem mais de uma significação. (...) Em
português, apesar de haver labor e trabalho, é possível achar na
mesma palavra trabalho ambas as significações: a de realizar uma obra
que expresse o indivíduo, que lhe dê reconhecimento social e permaneça além de
sua vida; e a de esforço rotineiro e repetitivo, sem liberdade, de resultado consumível
e incômodo inevitável.
No dicionário aparece
em primeiro lugar o significado de aplicação das forças e faculdades humanas
para alcançar determinado fim; atividade coordenada de caráter físico ou
intelectual, necessária a qualquer tarefa, serviço ou empreendimento; exercício
dessa atividade como ocupação permanente, ofício, profissão.
Mas trabalho tem
outros significados mais particulares, como o de esforço aplicado à produção de
utilidades ou obras de arte, mesmo dissertação ou discurso. Pode significar o
conjunto das discussões e deliberações de uma sociedade ou assembleia
convocada para tratar de interesse público, coletivo ou particular: “Os
trabalhos da assembleia do sindicato tiveram como resultado a greve”. Pode
significar o serviço de uma repartição burocrática, e ainda os deveres
escolares dos alunos a serem verificados pelos professores. Como pode indicar o
processo do nascimento da criança: “a mulher entrou em trabalho de parto”.
Além de atividade e
exercício, trabalho também significa dificuldade e incômodo: “aqui vieram
passar trabalho”; “a última enchente deu muito trabalho”. Pois junto a todas as
suas significações ativas, trabalho em português, e no plural, quer
dizer preocupações, desgostos e aflições. É o conteúdo que predomina em labor,
mas ainda está presente em trabalho.
Isso se compreende
melhor ao descobrir que em nossa língua a palavra trabalho se origina do
latim tripalium, embora outras hipóteses a associem a trabaculum.
Tripalium era um instrumento feito de três paus aguçados, algumas vezes
ainda munidos de pontas de ferro, usado pelos agricultores para bater o trigo,
as espigas de milho, o linho, para rasgá-los e esfiapá-los. A maioria dos
dicionários, contudo, registra tripalium apenas como instrumento de
tortura, o que teria sido originalmente, ou se tornado depois. A tripalium se
liga o verbo do latim vulgar tripaliare, que significa justamente
torturar.
Ainda que originalmente
o tripalium fosse usado no trabalho do agricultor, no trato do cereal, é
do uso desse instrumento como meio de tortura que a palavra trabalho significou
por muito tempo – e ainda conota – algo como padecimento e cativeiro. Desse
conteúdo semântico de sofrer passou-se ao de esforçar-se, laborar e
obrar. O primeiro sentido teria perdurado até o início do século XV;
essa evolução de sentido teria ocorrido ao mesmo tempo em outras línguas
latinas, como trabajo em espanhol, traballo em catalão, travail
em francês e travaglio em italiano.
No dicionário filosófico
você poderá encontrar que o homem trabalha quando põe em atividade suas forças
espirituais ou corporais, tendo em mira um fim sério que deve ser realizado ou alcançado. Assim, mesmo que não se produza nada
imediatamente visível com o esforço do estudo, o trabalho de ordem intelectual
corresponde àquela definição tanto quanto o trabalho corporal, embora seja este
que leve a um resultado exteriormente perceptível, a um produto concreto ou a
uma mudança de estado ou situação.
Todo trabalho supõe
tendência para um fim e esforço. Para alguns trabalhos, esse esforço será
preponderantemente físico; para outros, preponderantemente intelectual.
Contudo, parece míope e interesseira essa classificação que divide trabalho
intelectual e trabalho corporal. A maioria dos esforços intelectuais se faz
acompanhar de esforço corporal; uso minhas mãos e os músculos do braço quando
datilografo estas páginas, que vou pensando. E o pedreiro usa sua inteligência
ao empilhar com equilíbrio os tijolos sobre o cimento ainda não solidificado.
O trabalho do homem
aparece cada vez mais nítido quanto mais clara for a intenção e a direção de seu esforço. Trabalho, nesse sentido, possui o
significado ativo de um esforço afirmado e desejado para a realização de
objetivos; até mesmo o objetivo realizado, a obra, passa a ser chamado
trabalho. Trabalho é o esforço e também seu resultado: a construção como
processo e ação, e o edifício pronto.
(Suzana Albornoz. Texto adaptado).
15. Assinale a alternativa correta sobre o texto acima.
a. O texto explora basicamente o gênero narrativo, por meio do qual a
autora conta a história da evolução do trabalho, do século XV aos dias de hoje.
b. Embora pertença essencialmente ao gênero dissertativo, o texto faz
uso de algumas descrições que exploram o caráter sensorial do trabalho humano.
c. O gênero predominante no texto é o descritivo, empregado para
analisar a evolução da palavra trabalho em diversas línguas latinas.
d. O gênero narrativo presente no texto está a serviço da dramatização
da ideia de trabalho, que, segundo a autora, evoluiu da noção antiga de tortura
até chegar ao sentido moderno de esforço e resultado.
e. O gênero básico explorado pelo texto é o dissertativo, usado pela
autora para apresentar algumas ideias gerais ligadas à palavra trabalho.
16. Assinale a alternativa que apresenta os respectivos significados das
palavras “fardo”, “opacas” e “consumível”, conforme elas estão empregadas no
texto. [1º e 2º parágrafo].
a. o que custa suportar; que não são transparentes; que consome.
b. ocorrência funesta; que são oscilantes; que favorece o consumo
exagerado.
c. o que custa suportar; que não são transparentes; que pode ser
consumido.
d. ocorrência funesta; que são oscilantes; que consome.
e. aquilo que acontecerá a alguém; que são transparentes; que pode ser
consumido.
17. “Para alguns trabalhos, esse esforço será preponderantemente físico; para outros, preponderantemente intelectual”. [9º
parágrafo].
Assinale a alternativa correta quanto à relação que as palavras “físico”
e “intelectual” estabelecem entre si.
a. Homonímia. b. Sinonímia. c. Paronímia. d. Antonímia. e. Polissemia.
18. “Assim, mesmo que não se produza nada imediatamente
visível com o esforço do estudo, o trabalho de ordem intelectual corresponde
àquela definição tanto quanto o trabalho corporal, embora seja este que
leve a um resultado exteriormente perceptível, a um produto concreto ou a uma
mudança de estado ou situação“.
Assinale a alternativa que indica, respectivamente, o valor semântico
das conjunções assinaladas. [8º parágrafo].
a. Concessão e concessão. b. Concessão e consequência.
c. Intensidade e condição. d. Proporção e condição.
e. Intensidade e concessão.
19. Assinale a alternativa na qual o vocábulo que pertence à mesma classe gramatical que em “(…) uso minhas mãos e
os músculos do braço quando datilografo estas páginas, que vou pensando”
[9º parágrafo].
a. Talvez que a chuva passe e o tempo mude.
b. Eu sou como a garça triste que mora à beira do rio.
c. Lá longe, perdida na escuridão, uma que outra luz se projetava
imprecisa.
d. Entrou para o jornal sem outra recomendação que uns versos
apresentados ao editor por um amigo.
e. Vamos montar, que os outros não chegam.
20. Assinale a alternativa em que o sentido da palavra em destaque não
está ligado à noção de trabalho.
a. O mar é um cérebro em laboração.
b. Admiram-se os lavores de mosaico da basílica de São Marcos.
c. “(...) de amor eterno seja símbolo o lábaro que ostentas
estrelado”.
d. Estes versos são de minha própria lavra.
e. Laboriosa foi a organização do núcleo de países confederados
militarmente pelo tratado de Paris.
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