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quarta-feira, 13 de setembro de 2017

TEMA DE REDAÇÃO – PUC-RIO – 2013 – 1º Semestre

TEMA DE REDAÇÃO – PUC-RIO – 2013 – 1º Semestre


REDAÇÃO

Segundo a escritora Susan Sontag (1933-2004), a sanidade é uma “mentira aconchegante’. Realmente, é costume dizer que há uma linha tênue entre sanidade e loucura. Com base nesse enquadramento do tema, produza um texto dissertativo-argumentativo – claro, coerente e bem fundamentado – acerca da loucura como forma poética de visão, de vivência e de contestação do mundo. Você deverá, em cerca de 25 linhas, contextualizar o tema, explicar posições e manifestar seu ponto de vista. A seleção de textos a seguir tem por objetivo ajudá-lo a desenvolver suas próprias ideias a respeito da questão abordada. Alguns desses textos podem ser reproduzidos, em parte, na sua produção textual – assim como os demais constantes desta prova –, mas em forma de DISCURSO INDIRETO ou PARÁFRASE, com as devidas fontes mencionadas na redação. Coloque um título em seu texto.
NÃO ASSINE.

Texto 1 - Regressamos assim à imaginação. A essa louca por vezes fascinante e por vezes furiosa que mora no sótão. Ser romancista é conviver felizmente com a louca lá de cima. É não ter medo de visitar todos os mundos possíveis e alguns impossíveis. Tenho outra teoria (tenho muitas: resultado da frenética laboriosidade da minha razão), segundo a qual os narradores somos seres mais dissociados ou talvez mais conscientes da dissociação que os outros. Isto é, sabemos que dentro de nós somos muitos. Há profissões que combinam melhor que outras com este tipo de caráter, como, por exemplo, ser ator ou atriz. Ou ser espião. Mas para mim não há nada que se compare com ser romancista, porque isto nos permite não apenas viver outras vidas, mas também inventá-las. “Às vezes tenho a impressão de que surjo do que escrevi tal como uma serpente surge da sua pele”, diz Vila-Matas em A viagem vertical. O romance é a autorização da esquizofrenia.
Um dia do mês de novembro último eu estava dirigindo por Madri; era mais ou menos hora do almoço e lembro que ia a um restaurante me encontrar com uns amigos. Era um desses dias típicos do inverno madrileno, frios e intensamente luminosos, com ar limpo e escarchado e um céu esmaltado de laca azul brilhante. Estava na Modesto Lafuente ou em alguma das ruas paralelas, vias estreitas e com obrigação de dar passagem nas esquinas, nas quais não se pode andar a mais de quarenta ou cinquenta por hora. Assim, indo devagar, passei ao lado de um edifício antigo de dois ou três andares em que nunca havia reparado. Em cima da porta, um letreiro metálico dizia: CENTRO DE SAÚDE MENTAL.
Devia pertencer a algum organismo público, porque mais acima havia um mastro branco com uma bandeira espanhola se agitando ao vento. Eu passava em frente a esse lugar, enfim, quando de repente, sem que eu pretendesse nem previsse, uma parte de mim se separou e entrou no edifício transformada num paciente que vinha se internar. E num fulminante e intensíssimo instante esse outro eu viveu de tudo: subiu, quer dizer, subi os dois ou três degraus da entrada, com os olhos feridos pelo reflexo da fachada e escutando o furioso flamejar da bandeira, sonoro, abominável e atordoante; e segui para o interior, com o coração tremendo porque sabia que era para ficar, e lá dentro tudo era penumbra repentina, e um silêncio algodoento e irreal, e cheiro de cloro e naftalina, e uma lufada de calor insano nas bochechas. Aquela pequena projeção de mim ficou ali, no Centro de Saúde Mental, às minhas costas, enquanto eu continuava pelas ruas na minha picape rumo ao almoço, pensando em alguma futilidade, tranquila e impassível após aquele espasmo de visão angustiosa que caiu sobre mim como uma gota d’água. Mas, sem nenhuma dúvida, agora já sei como é internar-se num centro psiquiátrico; agora vivi isso, e se algum dia tiver que descrever num livro, saberei fazê-lo, porque uma parte de mim esteve lá e talvez ainda esteja. Ser romancista consiste exatamente nisso. Não creio que possa ser capaz de explicá-lo melhor.

Fragmento do livro A louca da casa, de Rosa Montero. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004. p. 21-23.

Texto 2 - Dizem que sou louco/ Por pensar assim/ Se eu sou muito louco/ Por eu ser feliz/ Mais louco é quem me diz/ Que não é feliz, não é feliz// Se eles são bonitos/ Sou Alain Delon,/ Se eles são famosos/ Sou Napoleão/ Mais louco é quem me diz/
Que não é feliz, não é feliz// Eu juro que é melhor/ Não ser um normal/ Se eu posso pensar/ Que Deus sou eu// Se eles
têm três carros/ Eu posso voar/ Se eles rezam muito/ Eu já estou no céu/ Mais louco é quem me diz/ Que não é feliz/ Não é feliz// Sim, sou muito louco/ Não vou me curar/ Já não sou o único/ Que encontrou a paz/ Mais louco é quem me diz/ E não é feliz/ Eu sou feliz.

Balada do Louco. Composição de Arnaldo Baptista e Rita Lee.
Disponível em: <http://www.letras.com.br>. Acesso em: 24 set. 2012.

Texto 3
Nádia Timm: A senhora sempre admite que a loucura une toda sua obra. “Loucura” sintetiza sensibilidade, percepção, forma de expressão diferente do convencional?
Hilda Hilst: É tudo isso, sim, mas também é um desequilíbrio total, um desarranjo. É horrível ser louco. Meu pai foi esquizofrênico paranoico e ele sofreu muito. As pessoas fantasiam muito com a loucura, ficam imaginando só um lado poético, genial de ser louco. Mas não é só isso. Padecer de loucura é terrivelmente doloroso. E não sei até onde a loucura garante a boa qualidade de sensibilidade ou percepção de alguém. O mundo teve loucos geniais, como Nietszche, Nijinsky e tantos outros. Mas teve os horríveis. [...] E também deve ter muito louco chato, maluco mesmo, como acontece com todo o mundo.

Fragmento de entrevista com a escritora Hilda Hilst (1930-2004), feita por Nadia Timm,
em 2002, para o site Cyber Goíás (<http://www.cybergoias.com>).


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