TEMA DE REDAÇÃO – PUC-RIO – 2014 – 1º Semestre
REDAÇÃO
Produza um texto dissertativo-argumentativo –
entre 20 e 25 linhas –, discorrendo sobre a liberdade. Ao compor o seu texto,
você deve incluir, em forma de discurso indireto ou de paráfrase,
algumas das afirmações da entrevista do economista Eduardo Gianetti ao jornal Folha
de São Paulo (23/10/2005) de modo a fundamentar pertinentemente suas
opiniões, com a devida fonte mencionada na redação. Dê um título ao
seu texto. NÃO ASSINE.
Entrevista (Folha de S. Paulo) - Eduardo
Giannetti
Liberdade é um termo muito utilizado em economia e tem seu
significado associado à oposição entre escolhas. O economista e cientista
social Eduardo Giannetti, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo (23/10/2005),
fala sobre isso.
Folha - Como se pode descrever o “Estado-babá”?
Eduardo Giannetti - O termo tradicionalmente usado
nesse caso é “paternalismo”, em que o Estado age em relação à sociedade, aos
indivíduos, como se fosse um pai; e eles, as crianças. Muitas vezes, a
preservação da liberdade requer um cerceamento de aspectos dessa liberdade. O
que precisamos chegar a um acordo é sobre quais são as restrições adequadas
para que possamos exercer nossa liberdade, todos ao mesmo tempo, da forma mais
criativa e promotora da realização humana. Quais seriam as regras do jogo para
que todos possam realizar seu plano de vida com o máximo de liberdade? A
fronteira disso não é fixa e imutável para toda e qualquer época. Situações de
calamidade pública ou guerras, por exemplo, sempre provocam uma expansão da
fronteira da ação coletiva, ou seja, do Estado. Quando se está vivendo uma
situação de emergência coletiva, as pessoas abrem mão da sua liberdade em nome
de um objetivo comum, que é a proteção, a segurança e a sobrevivência.
Folha - Qual o cenário futuro que podemos prever?
Giannetti - O conceito relevante nessa questão é o
que os economistas chamam de “trade off”: sacrificar um valor como contraparte
da obtenção de um outro. O “trade off” de que estamos falando aqui é
aquele entre liberdade e segurança. Um mundo de total segurança é um mundo que
sacrifica demais a liberdade; por outro lado, um mundo de liberdade anárquica é
um mundo em que a segurança é muito precária. Aí se têm dois extremos: de um
lado, a fogueira hobbesiana, a guerra de todos contra todos; e, de outro, o
congelamento, a fossilização do Estado totalitário.
Folha - O Estado tem a função de proteger o indivíduo
dele mesmo?
Giannetti - Muitas vezes são os próprios indivíduos
que preferem ser cerceados em sua liberdade, eles demandam isso. É o caso
imortalizado pela situação de Ulisses e a sereia: sabendo que não resistiria ao
canto das sereias, que seria uma morte certa, ele manda tapar com cera o ouvido
dos tripulantes do barco e ordena que o amarrem ao mastro do navio, para que
ele não possa dirigi-lo até a ilha das sereias. Ou seja, para preservar sua
liberdade e sua vida, ele cerceia temporariamente seu direito de escolha. Em
muitas situações da vida prática as pessoas preferem não ter opção. Essa
atuação do Estado é legítima, partindo dos indivíduos.
Folha - E onde fica o equilíbrio entre a prevalência da
maioria e a liberdade de uma minoria?
Giannetti - Não há panaceia. Tudo tem que ser
discutido e negociado. Em cada situação particular, os argumentos têm que ser
pesados, e é importante lembrar sempre que a benefícios correspondem custos. É
muito rara uma situação em que só haja benefícios.
Folha - De que outras formas, que não apenas a ação
restritiva, o Estado pode incentivar essa atuação consciente dos indivíduos?
Giannetti - O ideal seria ter uma população em que
cada indivíduo fosse preparado para responder de forma madura ao maior número
de questões; mas, infelizmente, estamos muito longe disso. O problema é que
muitas dessas restrições estão ligadas também a danos que se impõem a
terceiros. Fumar em local público, por exemplo. Hoje eu me lembro das salas de
aula da minha juventude, na USP, e fico estarrecido com o fato de que
aceitávamos aquilo como parte natural da vida: salas em que se tinha dificuldade
até mesmo de ver o professor, tal era a densidade da fumaça. Adam Smith dizia
que a justiça está para a virtude como a gramática está para o estilo. Sem
gramática não há linguagem, não existe interação social, todo o edifício da
ordem social desmorona. Mas sem estilo não há grandeza, não há uma expressão do
belo. O que falamos é do arcabouço de regras básicas para a interação humana. O
ideal é constituir regras que permitam que todos vivam a melhor vida possível
ao mesmo tempo. Existem, pelo menos, dois conceitos de liberdade. Isaiah Berlin
define a liberdade positiva e a negativa. A segunda é a ausência de restrições
na escolha e na ação de indivíduos. A primeira é a capacitação para o exercício
efetivo de uma escolha. De que vale a liberdade de ler Joaquim Nabuco ou
Machado de Assis para uma pessoa analfabeta? Se as pessoas não estiverem
preparadas e capacitadas, essa liberdade é vazia.
Folha - O Sr. concorda que muitas das restrições
impostas pelo Estado são impostas por pensamentos “puritanos” de parte da
sociedade?
Giannetti - A opinião pública, como a ação do
Estado, pode se tornar uma força tirânica e muito cerceadora. São dois mecanismos
diferentes de coerção e de cerceamento. Na verdade, o que estamos aprendendo
hoje é que o cérebro humano é modular, com motivações diferentes. Há um
processo permanente de negociação entre áreas do cérebro que nos motivam a
fazer coisas diferentes. O indivíduo está permanente e internamente cindido,
renegociando consigo mesmo o que faz. E essa negociação é escorregadia. O que
acontece é que, muitas vezes ciente dessa dificuldade de agir tal como ele
preferiria, pede que alguma força de fora, o Estado, por exemplo, defina para
ele os termos da transação, tentando fazer um contrato com ele mesmo, por meio
dessa força externa.
Texto adaptado da entrevista “O indivíduo no fio da
navalha”, publicada no caderno “Mais”, da Folha de S. Paulo (23/10/2005)
Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2310200507.htm>.
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